O Jerônimo da novela da TV: o da novela do rádio dependia de nossa imaginação. |
Eu nunca perguntei ou me perguntei explicitamente onde seria, como seria o tal do sertão do nosso destemido e invencível herói. O pa-ta-ta... pa-ta-ta... dos cascos dos cavalos, manejado pelo contra-regra no estúdio da Rádio Nacional, levava aquele grupo de garotos ao pé do rádio de Seo Adelino, na década de 50, a paragens indizíveis, só imaginadas. Eu sei que havia mato, aquele mato meio raquítico do semi-árido nordestino, muita poeira, ah! isso aí era bem nítido, bem acentuado, levantava aquele poeirão dos diabos quando os dois intrépidos cavaleiros disparavam na perseguição tenaz aos maus, aos bandidos impiedosos. Um branco, bonitão, alto, forte, o outro um negrinho pequeno e engraçado, o justiceiro e seu “inseparável” companheiro, Jerônimo e Moleque Saci.
Poderia ser uma cidadezinha como Seabra, lá na Chapada Diamantina, nos diziam que por aquelas bandas começava o sertão baiano. Mas Seabra, apesar de não ter luz elétrica, já tinha muitas ruas calçadas com paralelepípedo (que palavra!), não parecia muito apropriada para correrias de cavalo. Certamente seria lá pros arrebaldes, pois não era por ali que começava o sertão?
De qualquer jeito, a gente brincava com os amigos, com os primos, o mais atirado fazia o papel de Jerônimo, um outro era o bandido mais valente da novela atual. Os dois lutavam, eram “brigas” de fazer de conta pra ver quem derrubava quem.
Uma vez, de noite, numa “encenação” dessa com meu primo Jorge, subi num pé de figo (é esse mesmo o nome, de figueira?) pra me esconder (era num jardim defronte de minha casa, um jardim bastante afamado. Os jovens seabrenses que estudavam no Colégio Ponte Nova - onde hoje é a cidade de Wagner -, de uns presbiterianos norte-americanos da Fundação Baker, a mesma do Colégio 2 de Julho, de Salvador, diziam que o jardim parecia os jardins suspensos da Babilônia. Viu aí? Fui longe desta vez. Eram por assim dizer os intelectuais da terra, de férias, logo voltariam pra estudar. Eu morria de inveja deles, ainda mais que no colégio “dos americanos” havia um time de futebol dos mais badalados da região, e eu era bom de bola, o que atesta o apelido de Diabo Louro, criado pelo famoso locutor do serviço de alto-falante local, Robério, que narrava o jogo imitando os locutores da Rádio Globo do Rio de Janeiro, até os patrocinadores, Gillette!!!!, estalava enfático durante a narração).
E voltando à conversa que adiante ia, subi no pé de figo pra me esconder, escorreguei e caí. No dia seguinte, me levantei e minha mãe Nenen, assim em torno de mim, parecendo meio vexada, e olhei no espelho e minha cara estava toda cheia de manchas vermelhas. Não era sangue, era mercúrio cromo, daquele vermelhão que se usava antigamente. E fui me inteirar dos sucedidos da noite passada, tinha apagado total, nem da queda eu me recordava. E não sei como foi, ninguém viu, me acharam “morto” debaixo do pé de figo?
Podemos concluir que foi uma queda feia. Chamaram logo Sea Donana, que fazia as vezes de médica/enfermeira e etc e ela tomou as devidas providências. Me recuperei logo, acho que não ficou seqüela alguma. Dizem que minha mãe dizia: “Que menino corajoso, não se queixa, não reclama nada, não grita, não chora!”, quando Sea Donana aplicava o mercúrio cromo e as compressas quentes na minha cara estragada. E eu inconsciente, fora de mim, “desmaiado”, não estava sentindo nada, só sei disso porque me falaram no dia seguinte. Mas deve ter ficado a fama: “Que menino corajoso!”.
Não havia médico em Seabra, Sea Donana (por sinal, mãe do famoso Robério, locutor de futebol e da Gillette!!!!) dava conta do recado, sabe lá Deus como! Sea Donana que Alceu Correia Guedes e Gonçalves chamava Dona Donana, um nome extraordinário, era Ana, virou Dona Ana, depois Donana, depois Sea Donana, e agora vinha esse cara de fora, pernambucano, jovem, bonito, rico (pra nós era rico, era coletor federal, hoje seria auditor), com o modernoso Dona Donana. Me mandou uma vez, eu menino, dar um recado a “Dona Donana”, fiquei impressionado.
Bem, me desculpem, viajei. Será que Alceu curtia Jerônimo, o Herói do Sertão? Isto não sei, só sei que a dona do Pilha Pura vai se retar porque o texto está muito além do padrão do blog. Me desculpe, companheira. Prometo me conter na próxima.
Jadson, adoro ler suas histórias, é mesmo uma volta ao tempo.Saudades companheiro!!!Beijo.
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