O
noveleiro, digo o jornalista e escritor, Emiliano José deu uma justificada trégua
nos capítulos protagonizados pela jornalista Carmela Talento, na fantástica e
imperdível série #MemóriasJornalismoEmiliano, para contar um fato histórico
também envolvendo colegas de redação do Jornal da Bahia. E a trégua foi mais
que compreensível, pois serve também como um alerta para os que não sabem, ou
esqueceram, como a imprensa é tratada em uma ditadura. Em tempos de retrocesso,
nunca é demais refrescar a memória.
E
Emiliano não poderia perder essa oportunidade, ao se deparar com um documento
oficial do submundo da ditadura militar (assim mesmo, em minúsculo), de triste
memória. Trata-se do "Informe Confidencial", do Quartel General do
Comando Costeiro na Bahia, de sua 2ª Seção, Cisa, datado de 20 de junho de
1977, com informações da Secretaria de Segurança Pública da Bahia, com o tema "Situação
atual de repórteres na imprensa da Bahia". Nos próximos capítulos, que
seguem aqui com os comentários postados no face de Emiliano, onde a série é
originalmente publicada, ele conta como 19 comunistas, ele inclusive, se
instalaram de mala e cuia, foice e martelo, no JBa do também ex-comunista João
Falcão, arregimentados por Césio Oliveira.
Apesar
de retratar uma página infeliz da nossa história, o Informe Confidencial também
revela barrigadas hilárias de incompetentes arapongas, que chegaram ao cúmulo
de inventar comunistas e estratégias para atrair colegas da Tribuna da Bahia,
também descritos e investigados, como os queridos Aurora Vasconcelos e
Jolivaldo Freitas. Entre os mais “perigosos”, além do autor, Oldack Miranda, Tibério
Canuto, Antônio Jorge Moura, Dailton Mascarenhas, Dalton Godinho, Gustavo
Falcón, Miltinho e Joca. Os “comunas” também tiveram participação decisiva nas
experiências de jornais alternativos da época, como “Movimento”, “Em Tempo”, “Invasão”
e “Boca do Inferno”. Uma aula de história.
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Emiliano
José
20
de Dezembro 2019
Os comunistas
estão chegando
Os
comunistas estão tomando o "Jornal da Bahia" de assalto.
A
família baiana há de ser alertada.
Há
uma articulação muito forte de elementos esquerdistas no jornal.
Na
redação, já se contam 19 elementos, todos com registro nos órgãos de segurança.
E
eles são perigosos.
Têm
objetivos.
Querem
minar os órgãos oficiais, desacreditar o governo.
Farão
matérias distorcidas, de acordo com suas ideologias alienígenas.
Pretendem
explorar o custo de vida.
A
fome entre os mais pobres.
O
suposto despreparo dos organismos policiais.
Invasões
e grilagem de terras.
Violência
policial.
Dramas
sociais.
Menores
abandonados.
Inventarão
o diabo pra desacreditar o governo.
Se
não houver problemas, inventam.
Comunista
não é desse mundo, não.
Tem
artes com o cão.
Não
se deve brincar com essa espécie.
Os
do "Jornal da Bahia" têm certeza: irão atingir seus objetivos,
sobretudo minar o governo.
Vão
cavando, cavando, até explodir tudo.
Foi
assim com os vietcongs, não foi?
Os
principais dirigentes desse perigoso grupo são pela ordem Oldack Miranda,
Emiliano José da Silva, Tibério Canuto de Queiroz Portela, Antonio Jorge de
Souza Moura e Dailton Mascarenhas da Silva.
Antonio
Jorge de Souza Moura carrega o agravante de ser irmão de outra perigosa
comunista, e jornalista já famosa, Mariluce de Souza Moura.
Passado
o susto, comunista assusta, vamos botar a bola no chão.
O
ano: 1977.
Já
lá se vão 42 anos.
Ditadura
a todo vapor.
Geisel
era o ditador.
Dissera,
não obstante a abertura lenta e gradual, ser necessário continuar a matar
militantes de esquerda.
E
continuou.
As
informações sobre o "Jornal da Bahia" são de um "Informe
Confidencial", do Quartel General do Comando Costeiro na Bahia, de sua 2ª
Seção, Cisa, datado de 20 de junho de 1977.
Cópia
de Informação proveniente da Secretaria de Segurança Pública da Bahia, de 16 de
junho do mesmo ano.
O
assunto era, como registrado, "Situação atual de repórteres na imprensa da
Bahia".
Embora
sendo título genérico, como se a análise alcançasse a imprensa baiana toda, o
informe restringia-se ao "Jornal da Bahia", antro de comunistas.
A
articulação era poderosa: tentava naquele momento, tirar repórteres.... #MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Carmela Talento: Contemporânea de
todos eles com muito orgulho.
Joaquim Lisboa
Neto:
Frequentei aquele ninho de comunas com todo prazer
Mônica Bichara: Verdade
Carmelinha, só orgulho desses "perigosos" comunistas
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Emiliano
José
21
de dezembro 2019
CISA, órgão do
terror
O
documento do Centro de Informações da Aeronáutica (CISA), de 20 de junho de
1977, denominado "Situação atual de repórteres na imprensa da Bahia",
levava o carimbo de Confidencial.
O
CISA era um dos terríveis órgãos de segurança da ditadura.
Foram
oficiais do CISA os assassinos de Stuart Angel em maio de 1971.
Não
custa lembrar os momentos finais de Stuart Angel, 25 anos, dirigente do MR-8.
Preso
na manhã de 14 de maio de 1971 pelo CISA, no Rio de Janeiro, massacrado por
torturas, pele esfolada, é amarrado na traseira de um jipe da Aeronáutica e
arrastado de um lado a outro com a boca colada no cano de descarga do veículo.
Queriam
Lamarca.
Stuart
não falou.
Asfixiado
e intoxicado pelo monóxido de carbono, morre.
Tornou-se
um dos desaparecidos políticos.
Denunciamos
esse crime inominável em 1980, quando lançamos, eu e Oldack Miranda, o livro
"Lamarca, o Capitão da Guerrilha", hoje na 17ª edição.
Está
tudo lá, nos detalhes.
Ditadura,
assassina.
O
CISA, um dos braços do terror.
Pois
é.
Era
o CISA a preocupar-se agora com os perigosos comunistas do "Jornal da
Bahia".
O
documento levava o número 12891.
No
topo, lia-se "ficha OO5/CISA".
Avisava,
na folha de rosto:
"Esta
Seção encaminha cópia do documento constante do aneso, versando sobre SITUAÇÃO
ATUAL DE REPÓRTERES NA IMPRENSA NA BAHIA".
Atenção
revisão: o original grafa aneso, não anexo.
O
documento informava que o Grupo dos 19 vinha tentando aliciar elementos
comunistas presentes em outros jornais para reforçar a atuação no "Jornal
da Bahia".
Compensa
a citação:
"O
referido grupo vem tentando tirar da 'Tribuna da Bahia' e outros jornais para
juntarem-se a eles no JBa. o fotógrafo Milton Mendes Filho, 'Didico' (também
esquerdista), Jolivaldo Freitas; Mariluce Moura (atualmente na sucursal de O
Globo, está sendo conversada para voltar ao JBa.); Lena Coutinho (uma jovem
paulista, também de esquerda, que está há cinco anos na Bahia, vivendo como
hippie e repórter free-lancer); José Carlos Teixeira Gomes (foto publicada pela
Tribuna da Bahia, no dia 8 Jun 77, na seção Tribuna Popular, em matéria
relativa ao dia mundial da Liberdade de Imprensa); a repórter Aurora Lilian
Vasconcelos; João Neiva; Raimundo Mazzei e Ienaia Junquilho Freire".
Quem
estiver citado aqui e considerar equivocado por uma razão ou outra, deve
reclamar à Aeronáutica.
O
CISA não existe mais, extinto em 1988.
Óbvio:
o informante do CISA chutou pra todo lado, especulou à vontade...
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Mônica Bichara: O mais absurdo é
ver atualmente, com tantos recursos para ampliação da história, um monte de
babaca querendo reviver essas monstruosidades. Ditadura assassina
Isabel Santos: A emoção toma
meu coração quando são relembradas cenas das torturas no período da ditadura no
Brasil. Algo que me causa grande indignação. Abraço com muito carinho e
respeito os meus colegas que, vitimas desses insanos, resistiram com dignidade,
força, coragem..., e hoje, como você, Emiliano José , nos relatam com mais
detalhe parte dessa triste história. Minha eterna solidariedade a todas e
todos.
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Emiliano
José
22
de dezembro 2019
Comunistas afastam
indesejáveis
O
documento do CISA tem oito páginas. Vale um estudo. Não é meu objetivo agora.
Vou fazendo uma quase-reportagem.
À
página 2, acusa o fotógrafo Rino Marconi de se juntar "ao esquema".
Rino,
na leitura do CISA, era irmão de Mauro Marconi, "preso nas manifestações
de maio passado".
O
informante esqueceu de fazer o registro: Rino era irmão também de Paolo
Marconi, já famoso jornalista.
O
fotógrafo, sempre acompanhando a leitura do Documento Confidencial, seria
encarregado
de
dirigir os trabalhos fotográficos - ser o editor de fotografia, enfim.
Não
estou assinando embaixo.
Só
registrando.
A
escolha das fotos - a edição - deveria privilegiar "aquelas mostrando
aspectos negativos, e que coincidiam com as matérias que serão publicadas pelo
referido grupo".
Tome-lhe
teoria conspiratória.
O
Grupo dos 19 não era brinquedo, não.
Rino,
olhe a informação do agente infiltrado, teria feito o trabalho de queimar seus
colegas de trabalho, Anízio Carvalho e Manoel França, "elementos
contrários ao esquema".
"E
com a saída destes dois profissionais, Rino levará para o JBa. o fotógrafo
Milton Mendes Filho, já citado anteriormente".
Quem
conhece Rino, sabe de sua ética, do cuidado reservado a seus companheiros.
Mas,
informante é assim mesmo: tem de prestar serviços, inventar o que pode e o que
não pode.
O
Grupo dos 19 comunistas seguia seu trabalho, de modo disciplinado.
Trabalhava
para afastar antigos jornalistas, considerados "apolíticos".
O
informante cita Moacir Ribeiro, Rafael Pastore e Geraldo Lemos.
Seriam
afastados porque não faziam "restrições ao regime".
Deveriam
sair "para não atrapalhar a agitação, através o noticiário
distorcido". (sic).
Imaginação
à solta.
O
sujeito devia dormir com medo de acordar com algum comunista debaixo da cama.
Como
o atual presidente, não se descarte dormisse com uma arma na mesinha de
cabeceira, pronto a atirar no primeiro comunista a invadir sua casa.
Faço
um comentário.
E
falo apenas de mim, não obstante imagine interpretar o pensamento de vários
companheiros incluídos no Grupo dos 19.
Nossa
relação com Rafael Pastore, creio secretário de Redação à época, era de respeito
e admiração.
Não
havia qualquer indisposição com ele, muito ao contrário.
Nem
com ele, nem com o irmão Rêmulo Pastore, à época, penso, chefe de Reportagem.
Reminho,
como conhecido, disputou eleição comigo em 1982, ele candidato a vereador, eu a
deputado estadual.
Minha
relação com Moacir Ribeiro era tranquila, era então editor de Polícia.
Lembro-me
de uma ação comunista de que ele participou: comprou uma assinatura do jornal
"Em Tempo" na minha mão.
Nisso
eu era bom: campeão de vendas no Estado.
Geraldo
Lemos, ah, pense o leitor numa relação carinhosa.
Sobre
ele, compensa contar a história de uma greve...
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Mônica Bichara: Moço, esse
histórico sobre os comunistas na redação do JBa é um livro à parte. Muito bom
acompanhar essa aula em capítulos, melhor ainda conhecendo todos os personagens
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Emiliano
José
23
de dezembro de 2019
Greve contra
demissão
Geraldo
Lemos era redator-chefe do "Jornal da Bahia".
O
diretor de redação era Roberto Quintaes, trazido do Rio de Janeiro por João
Falcão.
Corria
o ano de 1978.
A
história contada agora foi rememorada por Renato Pinheiro.
Ele
deixara a "Tribuna da Bahia" e assumira a editoria de Política do
"Jornal da Bahia".
Quintaes
não foi com a cara de Pinheiro.
E
era recíproco.
Nas
rememoracões, Renato Pinheiro não economiza: "era um fascista".
Acreditava
tivesse a missão de enfraquecer Geraldo Lemos.
Acho
difícil tivesse vindo com essa específica missão.
Mais
provável era João Falcão querendo dar uma sacudidela no jornal.
Foi
buscar um nome nacional, com passagem por grandes jornais, entre os quais
"Jornal do Brasil".
Nas
reuniões diárias com os editores, parecia marcar Pinheiro - "ele tomou
assinatura comigo".
Chegava
a ser explícito com o editor de Política:
-
Aqui, meu amigo, manda quem pode, obedece quem tem juízo.
Pinheiro
não suportou tanto autoritarismo.
Um
dia levantou da pá virada, de saco cheio, chegou na redação já de caso pensado:
-
Aqui, não fico mais.
Sentou
à máquina, mandou ver.
Disse
tudo.
Batia
duro no diretor de redação.
Não
aceitava seus métodos.
O
título do texto: "Dispensando a batata quente".
Dizia:
o diretor fora importado "dos quintais do jornalismo brasileiro".
Declarava:
"estou pulando fora".
Prendeu
o texto no mural da redação.
Comprou
briga.
Foi
ao departamento de Pessoal encaminhar o pedido de demissão e se mandou.
O
texto caiu como uma bomba.
Quintaes
desceu virado na porra à redação.
Ordenou
a Geraldo Lemos:
-
Arranque esse texto do mural!
Digno,
Lemos negou-se:
-
Não sou censor do mural da redação.
Demitido.
A
redação reagiu.
Entrou
em greve.
João
Falcão sentiu o clima.
Demitiu
Quintaes.
Mas,
não readmitiu Geraldo Lemos.
Voltando:
o informante do CISA não era tão bom.
Geraldo
Lemos não era do Grupo dos 19.
Creio
nem de esquerda.
Porém,
digno, respeitado por seus colegas.
Inclusive
pelo Grupo dos 19.
#MemóriasJornalismoEmiliano
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Emiliano
José
24
de dezembro de 2019
Teorias
conspiratórias em curso
A
chamada Informação Confidencial do CISA, de 20 de junho de 1977, garantia: o
Grupo dos 19 se reunia com impressionante frequência.
Diariamente
- assegura o texto.
Assim,
detalhando, iam construindo o esquema a ser posto em prática.
O
trabalho andava a todo vapor.
Tinha
de ser assim, segundo o documento, porque havia uma edição especial programada.
Nela,
toda a equipe seria mostrada, com os currículos de cada um.
Difícil
entender o raciocínio.
E
daí?
Os
currículos apareceriam, e...?
O
informante era muito incompetente.
Fosse
jornalista, era dos piores, dos mais fracos.
Falta
coerência ao texto.
Mesmo
com toda a teoria da conspiração subjacente, com toda a fantasia decorrente,
podia ser melhor, ter um pouco mais de pesquisa até para informar com mais
precisão.
Ainda
bem.
Isso
nos deixava mais à vontade.
Explico:
para fazer jornalismo.
É,
enquanto a repressão via fantasmas, nós fazíamos jornalismo.
Levávamos
a sério a profissão.
Eu
saíra da prisão havia apenas três anos, estava em liberdade condicional, filho
de dois anos e pouco, família pra sustentar.
E
estava tentando me afirmar como jornalista.
Já
chegara a chefe de reportagem.
Sabia
dos limites do jornalismo empresarial.
Difícil
transpô-los.
Mas,
sabia também de suas possibilidades.
A
mercadoria-notícia cobra do empresário agilidade.
Não
é uma mercadoria qualquer.
Enfrenta
a concorrência.
E
além disso, não se deve esquecer, o patrão era João Falcão, um ex-comunista,
com ideias progressistas.
O
informe fala nele.
Diretor-presidente,
"homem que decide sozinho
a
linha de comportamento da redação, deixará o País nos próximos dias para uma
temporada nos Estados Unidos e Europa, devendo ficar ausente do Brasil por três
ou seis meses".
Sopa
no mel.
Com
a ausência de Falcão, sem uma autoridade para impor freios, o Grupo dos 19 podia
deitar e rolar, publicar, sem ser incomodado, "matérias distorcidas e
atentatórias ao regime".
Mas,
o informe tentava ir um pouco além do "Jornal da Bahia".
Além
do esquema no "Jornal da Bahia", o mesmo grupo, perigoso,
concorria...
#MemóriasJornalismoEmiliano
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Emiliano
José
25
de dezembro de 2019
Repressão pede
cabeça
O
CISA, no seu Informe Confidencial, dizia:
"Além
do 'esquema' no Jba., o mesmo grupo concorre às eleições para o Sindicato dos
Jornalistas, com o apoio de Césio Antônio Ferreira de Oliveira, Pedro Formigli
(este da sucursal do jornal '0 Estado de S. Paulo' e João Neiva, (este
atualmente na 'Tribuna da Bahia', onde tem a tarefa de atacar a SSP/BA,
buscando dar uma imagem negativa da Polícia), sendo antes elementos
reconhecidamente esquerdistas. No mês de abril, eles venceram as eleições para
dirigirem o citado Sindicato, porém a eleição foi anulada pela Delegacia
Regional do Trabalho por conter irregularidades" .
Muito
mal escrito, cheguei a corrigir alguma coisa, o informante - será que era
jornalista? - fantasia a mais não poder.
Neiva
trabalhava como jornalista.
Ninguém
havia lhe dado a tarefa de atacar a polícia.
Césio
e Pedro, como tantos outros, defendiam sua entidade sindical.
Natural.
O
sindicato era nosso.
Mas,
ditadura não combina com sindicatos livres.
Imaginar
uma central no "Jornal da Bahia" coordenando tudo só cabe na
imaginação fantasiosa do informante.
Os
jornalistas tinham posições políticas as mais variadas.
Desconfio
ser a maioria progressista.
De
esquerda, de esquerda, uma parte.
Fantasia
completa a ideia de uma articulação central destinada a controlar redações.
Tínhamos
de cumprir nossas obrigações profissionais, como repórteres ou editores.
Não
eram poucas.
Tínhamos
de ganhar o pão de cada dia.
Nem
isso a ditadura queria deixar.
O
coronel Luiz Arthur de Carvalho era secretário de Segurança Pública do governo
do Estado, entre 1975 e 1979.
Em
1970, me mandou pra tortura.
Botou
os olhos em mim quando saí da prisão, no final de 1974.
Repressão
é repressão.
Quando
fui para o "Jornal da Bahia", em 1975, pediu minha cabeça.
O
jornal resistiu.
João
Falcão não cedeu.
Revelei
isso na Assembleia Legislativa quando da sessão sobre o centenário de
nascimento dele.
Em
1977, ano do Informe Confidencial, além de tudo, eu tinha de dar conta do
estudo.
Havia
feito vestibular para Jornalismo, na UFBA no ano anterior.
Havia
à época uma luta intensa em defesa do diploma de Jornalismo como pré-requisito
para o exercício da profissão...
#MemóriasJornalismoEmiliano
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Emiliano
José
26
de dezembro de 2019
Repressão burra
Era
uma luta dura a dos defensores do diploma de Jornalismo como pré-requisito para
o exercício da profissão.
Terminou
vitoriosa.
Mas,
às vezes opunha jornalistas contra jornalistas.
Muitos
não possuíam diploma e exerciam a profissão havia muito tempo.
Muitos
deles, brilhantes.
Eram
os chamados provisionados.
Às
vezes, denominados "irregulares".
Chegaram
a fazer greve de fome em defesa do direito de continuar trabalhando.
Com
o tempo, a temperatura baixou, os diplomados cresceram em número, a convivência
entre os dois grupos se tornou pacífica.
Passou
a se aceitar a exigência do diploma.
Os
não-diplomados não seriam incomodados.
Eu
compreendi: devia entrar na Universidade, conquistar o diploma, atender,
tardiamente fosse, o pré-requisito.
Entrei
em 1976.
Saí
em 1980.
Combinando
trabalho e estudo.
Dois
anos depois, fiz concurso.
Passei
a dar aulas na UFBA.
De
irregular a professor.
Mestrado,
Doutorado, 25 anos como docente.
Sem
nunca abandonar o jornalismo.
Como
eu, outros resolveram seguir o mesmo caminho.
Caça
ao diploma.
De
ex-presos, lembro de Oldack Miranda e Dalton Godinho.
Houve
outros, como Paulo Roberto Sampaio, veterano já.
Foi
buscar o seu diploma.
E
ninguém podia deixar de trabalhar.
E
nós, os de esquerda, teríamos tempo para nos dedicarmos a controlar redações?
Isso
só cabia na cabeça burra da repressão.
Tínhamos
perfeita noção, já disse, dos limites da imprensa empresarial.
Além
de tudo, tais limites haviam sido excepcionalmente ampliados com a ditadura,
desde 1964, e particularmente depois de 1968, com o AI-5.
Não
cabiam muitas ousadias, embora muita coisa incômoda para a ditadura acabasse
sendo divulgada por imposição da realidade, dos fatos.
O
manto sombrio da ditadura não podia esconder tudo.
Os
jornalistas de esquerda, libertários, progressistas sentiam-se incomodados com
os limites da imprensa empresarial.
Sabiam
ser difícil transpô-los.
Então,
começaram a buscar outros caminhos.
Isso
sim, a repressão podia dizer.
Os
caminhos da imprensa alternativa...
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Fernando Lopes: Camarada
Emiliano, tenho lido com atenção tuas postagens sobre a historia do jornalismo
na Bahia vista de dentro. Tu pensas em condensar tudo em um livro( pode ser um
e book) ? penso que seria importantíssimo ter o conjunto da obra em um so
lugar. abs.
Emiliano José: Fernando Lopes
Há pressão pra isso. Tanto pra E-book quanto pra impresso. Vamos pensando.
Alguma coisa acontecerá. Obrigado
Mônica Bichara: Lembro muito
dessa briga dos provisionados, foi praticamente meu primeiro contato com o
Sindicato dos Jornalistas. Estava começando no Jornal da Bahia, fazendo
faculdade, iria me formar de qualquer jeito e não seria beneficiada por essa
solução, A greve de fome foi na Assembleia Legislativa
David Go Leal: E que belíssimo
trabalho a imprensa alternativa foi capaz de fazer com jornalistas diplomados
ou não. Nas cidades do interior, inúmeras produziam os seus periódicos... nos
movimentos sociais, sobretudo nos sindicatos, os boletins eram a alma da
comunicação, inclusive, pelo ritual e identidade que conferia ao militante que
o distribuía em sua base.
Jaciara Santos: Lembro que
Dailton (Mascarenhas) foi um dos que fizeram greve de fome. A gente temia pela
saúde dele, porque era muito magro...
Fernando Lopes: Jaciara Santos
fora os alternativos com cobertura mais ou menos nacional: pasquin, lampião ,
em tempo , companheiro , etc
Fernando Lopes: unidade ,
tribuna operária ....
Gilvane Caldas
Lima:
Essa é uma história que precisa ser contada ao público. Parabéns professor
pelos relatos da história tão significativa para o povo.
----------------------------------------------
Emiliano
José
27
de dezembro de 2019
Buscando caminhos
Nós,
da esquerda, tínhamos plena noção de sermos assalariados.
Vendíamos
nossa força de trabalho.
Embora
a atividade tivesse características muito especiais, lidássemos com mercadoria
sensível, não podíamos esquecer, pra usar expressão antiga, da velha matriz
marxista, quem detinha o controle dos meios de produção.
Longe
da visão conspiratória do 'Informe Confidencial", não tínhamos condições
de fazer o que bem entendêssemos.
Não
éramos nós a ditar a linha editorial.
Naturalmente,
eram os donos.
Sorte,
um fosse João Falcão, ex-comunista, e cujo progressismo não se perdera.
Havia
uma boa margem de manobra em nossa atuação.
Para
fazer jornalismo, nada mais.
Sorte,
surgisse a "Tribuna da Bahia", iniciativa de empresários
progressistas, onde também havia espaço para a atividade jornalística
relativamente livre.
E
digo relativamente porque, primeiro, existia ACM e sua arrogância,
autoritarismo, truculência.
Não
perdoava imprensa livre.
Atacou
sem meios termos primeiramente o "Jornal da Bahia".
Depois,
mais tarde, a "Tribuna da Bahia".
O
jornal "A Tarde", naquela fase, seguia rigorosamente sua trajetória
conservadora.
Mais
tarde, a mão autoritária de ACM cairá sobre ela também.
E
segundo, existia a ditadura.
Os
jornais, ao menos até o início dos anos 80, não iriam atacar em duas frentes.
Podiam
até brigar com ACM frontalmente.
O
"Jornal da Bahia" o fez.
Mais
tarde, a "Tribuna da Bahia", também.
Mas,
com a ditadura, não.
Aos
jornalistas de esquerda, quisessem desenvolver um jornalismo mais comprometido
com uma estratégia de combate à ditadura, cabia construir caminhos próprios.
Talvez
seja o caso de uma breve discussão sobre os "jornalistas de
esquerda".
Eu
uso a expressão num sentido muito amplo.
Havia
os da esquerda tradicional.
Podíamos
falar dos ex-presos, como Oldack /, Dalton Godinho, José Carlos Zanetti,
Denilson Vasconcelos, Tibério Canuto de Queiroz Portela e eu, e corro o risco
de esquecer alguém.
Compunham
lideranças jornalísticas vinculadas a projetos nacionais como
"Movimento" e "Em Tempo".
No
"Em Tempo", tivemos papel destacado. Tibério Canuto de Queiroz
Portela, do "Jornal da Bahia", seguiu para São Paulo e tornou-se um
dos principais jornalistas de "Em Tempo".
Desligou-se
do "Jornal da Bahia" em setembro de 1977, foi editor de Economia
primeiro e depois diretor-presidente do "Em Tempo".
Na
Bahia, constituímos uma forte sucursal.
O
jornal fez barulho.
Era
de esquerda.
Sem
meios-termos.
A
exemplo de outros dessa matriz, como "Movimento", foi duramente
perseguido pela ditadura...
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Vera Barbosa: Muito bom
relato....
David Go Leal :Belíssimas
#MemoriasJornalismoEmiliano
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Emiliano
José
28
de dezembro de 2019
Imprensa
alternativa
A
ditadura, no entanto, malgrado sentisse indisposição com "Em Tempo",
não tinha mais condições políticas de impor a censura prévia.
Era
uma conjuntura nova, de seguidos avanços das oposições, inclusive do surgimento
de um novo e forte movimento operário, Lula à frente.
Houve
números a marcar época, como o que publica uma lista de 233 torturadores
elaborada por presos políticos, de junho de 1978.
Mais
tarde, março de 1979, sai uma segunda lista de torturadores e o jornal
localizaria, ainda, o sítio clandestino 31 de Março, em São Paulo, onde eram
torturados presos políticos.
Na
Bahia, registro a presença da repórter Linalva Maria de Souza, não proveniente
da esquerda tradicional, mas que a ela se junta a partir de "Em
Tempo".
Nos
deixou precocemente, vítima de um câncer.
Em
1977, ano do "Informe Confidencial", nasce na Bahia o jornal
"Invasão".
Iniciativa
de dezenas de jornalistas, puxada pela esquerda tradicional, tinha um Conselho
Consultivo muito representativo: Adelmo Oliveira, Alberto Goulart, Cid
Teixeira, Chico Pinto, Edmilson Carvalho, Guido Araújo, Rômulo Almeida e
Ubirajara Rebouças.
Uma
olhada no expediente, e se constata a presença da quase totalidade dos melhores
jornalistas da Bahia.
Teve
vida efêmera.
Um
único e explosivo número.
A
matéria principal, base da manchete "Chumbo Neles!", assinada por
mim, Linalva Maria de Souza e Carlos Navarro Filho, fotos de Milton Mendes
Filho, denunciava o fato de a Companhia Brasileira de Chumbo estar envenenando
os operários com chumbo e cádmio, além de poluir toda Santo Amaro.
Foi
a matéria com o vereador Murilo Leite, então na Arena, no entanto, a de maior
repercussão.
Ney
Ferreira, dirigente do adesismo no MDB, criticado duramente por Leite, invadiu
a Câmara de arma em punho disposto, parece, a matar o vereador.
Não
o encontrou.
Não
se criaram as condições materiais para a continuidade daquela experiência, e o
jornal ficou naquele belo e solitário número.
Gustavo
Falcón qualifica "Invasão" como "o irmão sisudo do "Boca do
Inferno".
É
uma boa definição, ao menos bem-humorada.
Surgiu
meses após o fim da experiência do "Boca", da qual vamos falar ainda.
A
sucursal do "Em Tempo" seguia em frente, com dezenas de militantes,
não só jornalistas.
Eram
muitas as tarefas, incluindo a distribuição em bancas e venda de assinaturas.
Como
a do "Movimento", dirigida por Crisóstomo de Souza, secundado pelo
jornalista Jadson Oliveira.
Essa
intensa atividade jornalística desenvolvia-se paralelamente ao trabalho nos
jornais da imprensa empresarial.
Era
um exercício de outro tipo de jornalismo, liberto das amarras naturais da
grande imprensa.
Nesse
mergulho, aprendemos muito.
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Vera Barbosa: Um marco do
avanço do jornalismo no Brasil. O “Em Tempo” tinha convicções fortes,
militantes com determinação, e um caminho novo a explorar. Foi extremamente
importante para elucidar fatos, que jamais viriam à tona pela imprensa
tradicional. Bravo!!!
Emiliano José: Vera Barbosa
Beijos, querida irmã!
Mônica Bichara: Quanta lembrança
boa nesse texto, Emiliano. O Movimento era mesmo uma central de resistência, um
orgulho ter convivido com algumas pessoas dessa fase que ainda estão na luta
como Jadson Oliveira, Crisostomo de Souza, Chico Vasconcellos, Isabel
Santos.....E Linalva sempre me emociona falar dela, minha chefinha tão doce
Isabel Santos: Um momento
ímpar, Mônica Bichara, essa passagem pelo O Movimento, aprendendo/convivendo
com tanta gente genial. E, pra variar, um texto emocionante de Emiliano,
trazendo, além recordações de colegas como a querida Lina, informações
históricas valiosas desse período tenebroso. Pena o fim do Em Tempo. Mas a
nossa imprensa alternativa foi um orgulho.
Crisostomo de
Souza:
Beleza uma lembrança dessas. De lembrantes como vocês. Também politicamente
relevante. Aprendizados que não se perdem.
Isabel Santos: Olá, querido
Crisostomo. Quanto tempo, hein?. Você, no meu coração, sempre. Bjos
Joaquim Lisboa
Neto:
No "Em Tempo" Emiliano e Antonio Dias entrevistaram Lúcia Lyra, viúva
do advogado Eugênio Lyra. Antológica entrevista sobre a luta pela terra na
Bacia do Rio Corrente. Guardada a sete chaves no acervo da BIBLIOTECA
CAMPESINA.
Joaquim Lisboa
Neto:
Do "Invasão" numerúnico o exemplar da Campesina foi subtraído por
goteira, cupim ou qualquer coisa assim.
David Go Leal: Emiliano José
reunir os fragmentos ou séries completas desses periódicos será inestimável
para a nossa Memória. Quando posso folheio e emociono com velhos boletins que
mantenho guardados.
Lucia Correia Lima: David Go Leal Oi
se tiver p Boca e INVASÃO gostaria de fotografar
David Go Leal: Não, infelizmente,
não tenho. Guardo alguns do sindicato dos petroleiros, Alagoinhas e Mata de São
João, meus universos.
Lucia Correia Lima: Não citar Victor
Vitor Hugo Soares, João Santana, Lena Coutinho, Maria Lucia de Souza depois e a
mesma Lucia Correia Lima, tanto no Boca do Inferno na Rua Gregório de Mattos e
depois no INVASÃO, nome escolhido em reunião e defendido por mim e Victor Hugo.
Qdo comunidade ou favela era chamados de "invasão".
Desde
a invasão do Corta Braço que mãe militante do pc contava.
Maria
Souza. Sou eu! DESCULPAS
Vitor Hugo Soares: Bravo, Lúcia!
Coragem moral é isso que você acaba de demonstrar, produto em falta em nossas
"esquerdas" desde o advento do lulismo petista. Na verdade nem
esquerdista, nem centristas nem direitistas, mas dinheiristas, como dizia meu
saudoso pai.Verdade histórica o que você conta. Na verdade "Invasão"
-que só saiu uma vez mas causou uma revolução na Bahia a ponto de lembrado
ainda hoje (ou escondido) foi um nome sugerido por mim e aprovado pela maioria
em reunião histórica como você descreve, com seu apoio decisivo e de João
Santana, o condutor principal da publicação. Aliás, as reuniões para criar
Invasão são outro marco do do jornalismo de resistência inteligente em
Salvador. Buñuel tem razão: o homem é a sua memória. Sem memória o homem não é
nada.Só pusilanimidade e fanfarronice oca . Meu mais forte abraço para você,
querida. corajosa e firme amiga. Boas festas e vamos em frente..
Lucia Correia Lima: Vitor Hugo
Soares EXATO. But eu respeito ❤ e compreendo Emil
em quem sempre votei e minha mãe saudosa cearense tinha Emiliano José como
filho!. Sejamos firmes mas tentemos nunca perder o carinho pelos amigos, mesmo
discordando aqui ali acolá
Vitor Hugo Soares: OK, Amiga, mas o
que eu disse está assinado e não retiro uma vírgula. Minha questão não é de
pessoas. É de princípios. E nisso eu não transijo. Beijos.
Emiliano José: Vitor Hugo
Soares Como eu, caríssimo Vitor Hugo. Não entro na discussão aqui do que você
chama lulopetismo por considerar local impróprio, mas nesse caso nossa
divergência é abissal. Quanto à sua contribuição para o Invasão, inegável. Como
a de quase uma centena. Importante suas lembranças. Ajudam. Nossas diferenças
político-ideológicas atuais não serão tratadas aqui, já disse. Atuais,. porque
antes comungávamos muito. E elas não eliminam o meu respeito e consideração por
você, por sua enorme contribuição ao jornalismo da Bahia. O mundo é diverso, e
a diversidade é a riqueza da existência.
Lucia Correia Lima: Vitor Hugo
Soares beijos também e todos. Te admiro muito.
Lucia Correia Lima: Emiliano José
DESCULPA "de quase uma centena" não!!! João Santana e Vitor Hugo
Soares lideraram este MOMENTO único na história de nossa imprensa
Emiliano José: Lucia Correia
Lima O Jornal é testemunha. Muitos lideraram. E eu não estou disputando isso.
João Santana foi e é meu amigo. Paro por aqui. Só continuo a escrever a série.
Reduzir a duas pessoas aquela iniciativa é erro. Paro sobre 'Invasao". Eu
estava lá. Em tudo. Inclusive na matéria principal. Amanhã,. volto, dando
sequência. E todos os comentários serão bem-vindos. Como sempre. Termina sendo
um trabalho coletivo.
Oculte
ou denuncie isso
Vitor Hugo Soares: Só um
esclarecimento mais. Aqui, neste caso, não se trata de liderança. Aqui é uma
questão de fatos, de memória, de verdade. Ou pior: de se tentar apagar (ou
esconder) fatos, pessoas, memória e reduzir tudo (ou quase) a guetos
ideológicos, acríticos, a rasgar de seda. .É disso que falo e contra isso me
insurjo. É só, por enquanto.
Crisostomo de
Souza:
Grande , Vitor Hugo! Estava faltando você??
Lucia Correia Lima: Emiliano José
que bom reconhecer "muitos". Pena que isto não se aplique ao pt um
partido de um só líder que nunca pensou em formar outros
Vitor Hugo Soares: Crisostomo de
Souza Obrigado, Crisóstomo. Fico muito feliz também por este reencontro com
você. Forte abraço.
Emiliano José: Deixei João
Santana, Lena e tantos outros para quando tratasse do "Boca do
Inferno". Anuncio hoje. Fotos, você pode me ensinar a postar aqui, ainda
não sei. Do Invasão, expediente deve ter 100 nomes. Não há razão pra ignorar
nenhum nome. Essa história começou com o "Informe Confidencial" do
CISA, se você está acompanhando. Não é bom ver fantasmas. Vitor Hugo, João
Santana, tantos outros fazem parte de tudo isso. E eu, que sou petista, me
esforço pra recuperar a memória de nosso jornalismo, tão precária. Você poderia
fotografar o expediente do Invasão e me mandar. Não o tenho em mãos. Estou
guiado pela memória e pelo livro de Gustavo Falcón. Os nomes estão lá. Não iria
listá-los aqui. O editor chefe era Valverde. Ainda bem que suscitei essa
discussão.
Lucia Correia Lima: Emiliano José
esta centena foi apenas generosidade misturado com chamado.
Não
tenho o livro de meu compadre Falcon. Vou solicitar nem os jornais. Quem tem
muitos é o Vander Prata. Pelo menos ele deu acesso para o autor de Um
Marqueteiro no Poder, livro que fez moro focar no JC. Too.
Lucia Correia Lima: Sim contar a
HISTÓRIA sem lados é o que espero de você como jornalista.
Aliás
creie antipatias quando disse e continuo a dizer: jornalista que se filia a
partidos, deixa de ser jornalista.
A
história há de ser contada de vero um dia.
Vou
ligar Gustavo amanhã.
Abraço.
Te admiro mesmo com nossas sérias divergências neste estágio.
Lucia Correia Lima: Engraçado
Parquetina não tenho lembrança. Ele me demitiu na assessoria de Mario prefeito,
porque nem notei seu assédio.
Emiliano José: Lucia Correia
Lima Essa ideia sua é equivocada. Nunca deixei de ser Jornalista. E sempre fui
filiada a partido. É possível separar as coisas, quando necessário. Tive larga
experiência nisso. E essa história de Jornalista sem lado não existe. Outra
coisa é ser honesto no trato da notícia, não distorcer. Dei aula a vida inteira
e sempre ensinei isso. Nunca fui advertido por distorcer. O jornalismo atual é
profundamente partidarizado. Pela direita. Eu deveria ter deixado de ser
Jornalista?
Emiliano José: ...fui
filiado...
Lucia Correia Lima: Emiliano José
bem continua a trabalhar acordo as 5.30. Muito a dizer sobre isto amanhã.
Adianto:
nunca devemos nos nivelar por baixo. Depois um colega seu Palácios, me ensinou
faz tempo. Chamar gangs de "direita" é grave equívoco.
Crisostomo de
Souza:
Digaê, amigo Jadson Oliveira! Cadê você?
Mônica Bichara: Verdade; Cadê
você, Jadson Oliveira
-----------------------------------------------
Emiliano
José
29
de dezembro de 2019
Um estudo
É
um livro de pouco mais de 150 páginas.
"Os
baianos que rugem - A imprensa alternativa na Bahia" é uma construção
coletiva de alunos da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFBA,
assinada por Gileide Vilela, Rosa Beatriz Gonçalves, Ruy Aguiar Dias, Terezinha
Flor, orientação do professor Gustavo Falcón, também signatário.
Tem
apresentação do saudoso professor Ubirajara Dórea Rebouças.
Alguns
podem considerar prodígiosa a minha memória.
Não
é.
Tudo
é pesquisa.
Fui
ativo participante de "Invasão".
O
único exemplar testemunha isso.
Os
autores do livro, voltado a várias publicações alternativas, afirmam a
preocupação do jornal "em colocar o jornalismo em primeiro plano, embora
não esconda seu caráter oposicionista".
Aborda
questões político-eleitorais "sem apelar para clichês da esquerda".
A
história de criação do jornal "guarda alguma similitude com o nascimento
do alternativo 'Movimento', fruto de um 'racha' na equipe do 'Opinião'.
O
'Invasão' surge alguns meses após o fim da experiência do 'Boca do Inferno',
como uma resposta da equipe que perdeu o 'Boca do Inferno' para os
paranaenses".
Os
autores concedem ter sido "Invasão" melhor estruturado e organizado
que o "Boca do Inferno", possuir um quadro hierarquizado, com a
"evidente preocupação contra possíveis 'rebeliões anarquistas' intestinas,
como as ocorridas no 'Boca', e sinal da presença mais representativa de
jornalistas menos identificados com o desbunde".
O
Conselho de Redação era constituído por Carlos Sarno, Estevam Dulci, Gustavo
Falcón, João Santana Filho, Lena Coutinho, Maria Lúcia de Souza, Oswaldo Gomes,
Tibério Canuto e Victor Hugo.
Redação
composta por 37 profissionais.
Arte
composta por Aloísio Filho, Buxa, Chico Barreto, Fernando Borba, Nildão e
Pedrinho Braga.
Um
bocado de colaboradores e correspondentes não-remunerados no Brasil e no
exterior.
Editor
e diretor-responsável, José de Castro Leal Valverde.
O
jornal contou "... com grandes fotógrafos da Bahia, os melhores repórteres
da Bahia, comentaristas políticos e uma estrutura, do ponto de vista da
aceitação e da legalidade, inteiramente organizada...", de acordo com
Gustavo Falcón.
No
entanto, só resistiu a um solitário número.
Fato
atribuído pelos autores ao esvaziamento da imprensa alternativa no País.
Seguramente,
no entanto, não teria vida tão efêmera tivéssemos nós, seus organizadores,
pensado com maís atenção aos aspectos materiais de sua sobrevivência.
Não
o fizemos.
Havia
ainda espaço para crescer, não ocupado.
"Invasão",
no entanto, marcou época.
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Vitor Hugo Soares:
"Invasão": "O Conselho de Redação era constituído por Carlos
Sarno, Estevam Dulci, Gustavo Falcón, João Santana Filho, Lena Coutinho, Maria
Lúcia de Souza, Oswaldo Gomes, Tibério Canuto e Victor Hugo". Não é por
nada , mas não custa esclarecer que nesta relação de nomes e sobrenomes
completos e escritos corretamente (como deveria ser) o "Victor Hugo"
que aparece aí é este que vos escreve e assina:Vitor Hugo Soares (sem c e com
sobrenome). Faço o reparo por dois motivos simples, mas essenciais: 1) Tenho
orgulho e sinto grande honra por ter participado da construção do alternativo
"Invasão" - que considero uma das mais ricas e valiosas experiências
do seu tempo na Bahia de como pensar e fazer jornalismo - responsável inclusive
pela sugestão do nome do jornal, aprovada pela maioria, em reunião histórica.2)
Tenho orgulho e sempre cuidei de honrar - na vida e na profissão - o nome que
carrego. Tem mais, muito mais, sobre Invasão e jornalismo na Bahia - inclusive
as razões verdadeiras de só ter saído um único e referencial número, mas fico
por aqui. Faço apenas uma esclarecimento: Sigo abominando práticas stalinistas,
explícitas ou mal disfarçadas. Feliz 2020 a todos..
Emiliano José: Vitor Hugo
Soares Para esclarecer e para que não se veja fantasmas, fui fiel ao que está
no livro. Seu esclarecimento ajuda. Quanto a abominar práticas stalinistas,
neste caso temos unidade.
Vitor Hugo Soares: Emiliano José Tá
legal, Emiliano. Só estranho e me surpreende que você, pesquisador acadêmico
tão cuidadoso - que me conhece há pelo menos uns 40 anos - tenha passado o erro
adiante. Abs.
Emiliano José: Vitor Hugo
Soares Com tanto pé atrás, resolvi manter. Você pode conferir: está lá. Posso
ter reproduzido outros erros nos nomes. Talvez devesse ter colocado sic. Pra
não suscitar dúvidas. Acho que está tudo esclarecido.
José Carlos
Teixeira:
Apenas a título de documentação: o Expediente registra Victor Hugo Soares. Com
c. Como vemos na imagem abaixo. Nele, a listagem completa dos jornalistas que
compunham a redação, entre os quais figura também esse modesto locutor,. Mais
os correspondentes, inclusive no exterior (que luxo!!!), os colaboradores, o pessoal
da arte e os Conselhos , o de Redação e o Consultivo.
Lucia Correia Lima: José Carlos
Teixeira Maria Lucia de Souza sou eu. E, este "conselho" era apenas,
assim como o expediente, uma forma de
1.
Atrai, envolver estas pessoas colegas
2.
Dar à publicação DEFESA notabilidade.
POIS
90% DESTAS PESSOAS NUNCA NADA FIZERAM NO JORNAL NEM PARA O JORNAL
Zeca Peixoto: Tenho esse
excelente trabalho sobre a imprensa alternativa na Bahia coordenada pelo
professor Gustavo Falcon.
Emiliano José: Zeca Peixoto
Excelente!
Zeca Peixoto: Emiliano José e
indispensável!
Emiliano José: Logo depois das
festas, aula. Edição Facebook.
Zeca Peixoto: Emiliano José já
tá na agenda! Rs
José Carlos
Teixeira:
Vai a capa do Invasão:
Emiliano José: José Carlos
Teixeira Obrigado, Teixeirinha. Queria saber transpô-la para o texto.
Analfabeto digital.
Vitor Hugo Soares: Maravilha, José
Teixeira.Maravilha, Parabéns por este extraordinário resgate que você faz da
história do jornalismo alternativo na Bahia. Na capa já se vê o diferencial do
"Invasão" em relação a outros exemplares do tipo: jornalismo na veia
em lugar de pregação ideológica. A marca do talento do editor José Valverde.
Viva e obrigado!.
Rui Patterson: Além da correta
nomeação dos "conselheiros", porque não tratar do que realmente interessa,
o projeto do jornal e o fato de ter tido somente uma edição. Terá sido a
abominação de práticas stalinistas explícitas ou mal disfarçadas?
------------------------------------------------
Emiliano
José
30
de dezembro de 2019
Inesquecível matéria
Foto
do número único de "Invasão, de março de 1977, retirada do livro "Os
baianos que rugem - A imprensa alternativa na Bahia", feito sob a
orientação de Gustavo Falcón.
José
Carlos Teixeira havia mandado uma foto bem melhor para os comentários do último
capítulo de minha série sobre a imprensa baiana.
Uma
manobra de analfabeto digital, eu, apagou-a.
Pedi
que me enviasse de novo, por mais nítida.
Estou
aguardando a gentileza dele, se puder.
A
foto publicada, como podem ver, é muito precária.
Fica
como documento.
Já
falei bastante do jornal, mas devo fazer o registro sobre o autor da matéria
mais explosiva, a entrevista com o vereador Murilo Leite, então na Arena:
Tibério Canuto.
Ou,
se quiserem o nome todo, Tibério Canuto de Queiroz Portela.
Devia
ter corrigido também o nome de Victor Hugo, assim grafado no livro, para o
completo e correto, Vitor Hugo Soares.
Fica
o registro.
Tibério
foi uma espécie de preceptor para mim na Ação Popular.
Foi
dirigente regional da Organização na Bahia.
Caiu
em maio de 1971.
Dividimos
cela na prisão.
Saiu
antes de mim, e tornou-se jornalista reconhecido.
Mais
tarde, já disse, será diretor-presidente de "Em Tempo".
E
seguirá como jornalista.
Por
acaso, está passando alguns dias em Salvador
Reside
em São Paulo.
Daquela
matéria, jamais esqueceu.
#MemóriasJornalismoEmiliano
José Carlos
Teixeira:
Vai a foto aqui. Mais nítida.
Emiliano José: Beleza,
Teixeirinha! Muito obrigado
José Carlos
Teixeira:
O Expediente (publiquei em outro trecho do post, mas ficou escondido:
Lucia Correia Lima: A BEM DA VERDADE
90% deste expediente e conselho já era a mente criativa de João Santana com
anuência e todos: NADA fizeram para o JORNAL no jornal.
Apenas
era uma jogada para
Ernandes Santos: Que maravilha
Nelson Simões: Muita gente
boa..
Nelson Simões: Não importa. O
que fica é a história. Se não morresse no n* 01 é quw saberíamos de verdade, se
era ou não apenas para constar os nomes...
Vitor Hugo Soares:
"Invasão" não morreu no primeiro número. A publicação alternativa e
independente foi matada, por torpe combinação de interesses de governo
estadual(e ditadura federal), Prefeitura e empresários (da grande imprensa,
inclusive), temerosos diante do enorme impacto jornalístico causado pela
primeira edição, sobre a qual eles não tinham controle. Foi pressão pesada
sobre profissionais e muitos não resistiram
------------------------------------------------
Emiliano
José
31
de dezembro de 2019
Boca do inferno
Surgido
em julho de 1976, foi ideia de um grupo de jornalistas desencaixados da grande
imprensa e que já haviam namorado, flertado, se envolvido com a imprensa
alternativa fora da Bahia.
Essa
descrição é de Gustavo Falcón.
A
ideia foi nascendo nas noites de farra da velha Salvador.
O
álcool ajuda a imaginação.
O
álcool e o que mais seja.
Por
que não fazer uma coisa nova na Bahia?
Por
que não ir além do feijão-com-arroz tradicional da imprensa empresarial?
Resgatar
o jornalismo.
Era
a pretensão.
Texto
coloquial, frequente uso de gírias.
Reportagens.
Análises,
restritas a algumas poucas matérias.
Temas,
de natureza social.
Envenenamento
por mercúrio em Alagados.
Analogia
entre a miséria e o padecimento humano na África e em Salvador.
Retirantes
da seca na Bahia.
Matérias
tinham acentuada cor local.
O
esquecido box baiano, lembrado.
Falcón
dirá: o jornal fazia política na linguagem.
Os
jornalistas com liberdade de falar na primeira pessoa.
E
isso era um sacrilégio na imprensa baiana, colonizada, como todo o jornalismo
brasileiro, pelos padrões dos New York Times da vida, pra aceitar a provocação
de Falcón, um de meus mestres.
O
jornal assume o texto personalizado, jornalista deixa de ser Deus, o ser da
revelação, da verdade.
Pode
dizer, escrever eu acho ouvi me disseram me contaram eu fui lá e vi.
Isso
era uma revolução.
Representou,
como expresso no livro "Os baianos que rugem...", uma articulação de
forças heterogêneas a juntar jornalistas, poetas, fotógrafos, desbundados,
ex-militantes.
Nessa
iniciativa, estavam excluídas a frieza do noticiário e o release.
Projeto
gráfico singular, utilizou amplamente a fotografia, cartuns.
Impresso
em off-set, tablóide.
Não
enfrentou censura.
No
terceiro número, no entanto, deu de cara com a mão pesada, violenta, da
ditadura: Polícia Federal caiu matando, invadiu a redação, quebrou a porra
toda.
Ditadura
é ditadura.
Foi
o fim do "Boca"...
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Jose Alcino Alcino: Deputado, o Sr
tem algum exemplar dessa edição da manchete?
Emiliano José: Tenho! Único!
Emiliano José: Pode passar aqui
em casa, ler na varanda. À disposição. Cobro depois, numa visita a Itacaré.
Jackson Souza: O esquadrão da
morte do ACM.
David Go Leal: Ernandes Santos
Lucia Correia Lima: O Boca surge na
verdade, inspirado nas aventuras do jornalismo independente de SP. João Santana
fã de Hamilton Almeida mentor de O Bondinho.
Lucia Correia Lima: Um dos mentores.
Como Sergio de Souza, Narciso Kallyli, Paulo Poké de Jesus que comandou uma
revolução gráfica.
Lucia Correia Lima: Foi fechado
depois de publicarmos por idéia de Lena Coutinho, poemas de Goubery
Antonio Pastori: Adorei “Tigre da
Esso e Elefante da Shell atacam Água de Meninos”.
-------------------------------------------------
Emiliano
José
1º
de janeiro 2020
Um jornal ao lado
dos despossuídos
Foi
uma das mais ricas experiências da imprensa alternativa.
Contava
com profissionais ousados e criativos.
Naufragou
após o quarto número, cujo exemplar não deu as caras em Salvador: rodado em São
Paulo, constitui uma 'raridade arqueológica", no dizer dos autores de
"Os baianos que rugem...".
Difícil
pudesse dar certo.
"Não
possuía uma estrutura administrativa, era caótico, as decisões de pauta
ocorriam na base do grito, na imposição pela postura mais agressiva".
E
mais: não existia como empresa juridicamente constituída, era uma ficção
jurídica - é depoimento de Gustavo Falcón.
Como
empreendimento, um fracasso.
"Invasão",
desse ponto de vista, também.
Já
vimos: durou um número.
"Boca",
ao menos, quatro, isso contando o quarto número, até agora não localizado.
Gustavo
Falcón o define como "uma experiência marginal":
-
A sede era em pleno puteiro, o jornal era completamente marginal, na rua
Gregório de Matos, quer dizer em pleno brega do Pelourinho. O próprio nome já
era uma coisa maldita. Uma referência ao poeta Gregório de Mattos, cuja obra
satírica escandalizou a Bahia setecentista.
Não
compensa citar nomes.
Uma
infinidade.
Dos
melhores do jornalismo baiano.
Constituiu-se
inegavelmente num espaço criativo no interior do jornalismo baiano.
Talvez
o momento mais rico das experiências alternativas na Bahia, do ponto de vista
do jornalismo.
Conseguiu
articular denúncias fortes do cotidiano pobre de Salvador no contexto de uma
nova forma de fazer jornalismo, de nítida inspiração existencialista, sem nunca
perder uma visão de esquerda, tendo lado: era sempre o dos espoliados, dos
deserdados da sorte.
A
hegemonia dessa experiência era de vinculados à ideia do movimento
contracultural, a sacudir o mundo naquela quadra histórica.
Conseguiu
resgatar a força do jornalismo, sem deixar se influenciar pelos poderosos
grupos manipuladores da opinião pública.
Sacudiu
uma boa parte do segundo semestre de 1976 - sobrevive de julho a outubro.
Uma
contribuição inestimável ao exercício de um jornalismo em busca da verdade e da
liberdade.
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Jorge Américo Góes
de Almeida:
Desejo-lhe um ano de 2020 com saúde, paz, amor, justiça e liberdade!
Emiliano José: Muito obrigado,
querido companheiro. Saberemos enfrentar os desafios de 2020. Abração
Solange Souza Lima
Moraes:
Maria Gil
Lucia Correia Lima: Curiosidade:
João Santana foi ao encontro de Gil na clinica que substituiu a prisão por
porte de maconha e lá encontrou com Hamilton Almeida Filho o Haf, seu ídolo
pioneiro na imprensa de jornalistas que enfrentou a ditadura. Um ex meu marido
outro então marido.
Tenho
a cassete da entrevista de ambos com Gil preso. Fiz cópia e há alguns anos
mandei para João. Além de botar em CD
Emiliano José: Lucia Correia
Lima Preciosidade
Lucia Correia Lima: Emiliano José
vou socializar. Fazer cópias
Leandro Fortes: Lucia Correia Lima
Que sensacional!
Lucia Correia Lima: Leandro Fortes
escrevendo sobre tudo isto
Mônica Bichara: Que relíquia,
esse material é para ser socializado mesmo. Fantástico
Lucia Correia Lima: Mônica Bichara
vou providenciar. Grata por sua linda amizade. Deixei mensagem no zap
Claudia Moreira de
Carvalho:
Podia scanear e postar no face...
Lucia Correia Lima: Claudia Moreira
de Carvalho vou fazer site
Claudia Moreira de
Carvalho:
Lucia Correia Lima OBRIGADA 💪🏼‼️
David Go Leal: Ernandes Santos
Adilson Borges: Maravilha! Bota
na roda
-------------------------------------------------
Emiliano
José
02
de janeiro 2020
Fazendo história
Não
imaginem vocês tenha tratado do vigor da imprensa alternativa em 1977 por
acaso.
Estava
noticiando sobre o "Informe Confidencial" do CISA, de meados de 1977,
e de repente me vi num longo desvio, abordando "Invasão" e "Boca
do Inferno", surgidos entre 1976 e 1977.
O
desvio foi consciente.
A
repressão olhava de um lado, a gente ia pra outro.
Sabíamos,
a esquerda tradicional e a esquerda contracultural, dos limites da imprensa
empresarial.
Quiséssemos
um jornalismo menos limitado, tínhamos de trilhar caminhos próprios.
Aventurar-nos.
Assim
foi.
Olhando
os resultados hoje, podemos dizer da precariedade dos resultados.
"Invasão",
um número.
"Boca
do Inferno", quatro.
Mas,
assim, falamos apenas da longevidade, da sustentabilidade dos projetos.
Inegavelmente,
foram iniciativas revolucionárias do ponto de vista do jornalismo, e isso era o
que perseguíamos.
Nenhum
deles levou em conta devidamente as dificuldades econômicas.
Parássemos
pra analisar, e quem sabe não saísse um único número.
Fomos
em frente, fizemos história.
Enquanto
a repressão olhava pra dentro dos jornais, especialmente para o "Grupo dos
19" do "Jornal da Bahia", nós corríamos por fora e produzíamos
um jornalismo corajoso e de qualidade.
Claro,
a repressão tomou conhecimento de nossos passos.
No
terceiro número do "Boca", caiu matando, e disso já falamos.
Do
"Boca", não participei, mas estou falando de um movimento amplo.
Poderia
acrescentar "O inimigo do Rei", do mesmo período, de inspiração
anarquista.
Dele,
no entanto, já falei na fase inicial dessa série.
O
documento da repressão é interessante.
Revela
o espírito de uma época.
A
tentativa de localizar líderanças.
E
devo acentuar, se não o fiz suficientemente: no "Jornal da Bahia"
cumpríamos nossas tarefas com zelo profissional, fosse qual fosse a pauta a nos
chegar às mãos.
A
principal liderança sindical era Anísio Félix, com quem tínhamos divergências,
não obstante não desconhecêssemos seu valor.
O
jornalismo alternativo era uma tentativa de ir além do dia a dia.
No
cotidiano da grande imprensa, as grandes matérias não são tão frequentes.
Acontecem
de vez em quando...
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Mônica Bichara: Esse material
que você está revelando é uma aula de história para as gerações mais novas,
Emiliano José. A imprensa alternativa tentava minar uma repressão real, num
tempo em que tudo era difícil. O contato tinha que ser pessoal, reuniões pelas
madrugadas, textos datilografados que precisavam ser entregues em mãos.....Não
tinha celular, zap, e-mail, google, redes sociais.....era resistência mesmo, na
marra
-------------------------------------------------
Emiliano
José
03
de janeiro de 2020
Diagnóstico do
Grupo Esquerdista
No
"Informe Confidencial" do CISA, no final da página 2, há uma
confissão de dificuldades:
"Esclarecemos
que no momento este Órgão não dispõe de condições para aprofundar o presente
Informe".
A
partir daí, listam-se os nomes e os dados recolhidos sobre eles.
Abre
com Antônio Jorge de Souza Moura. Como em todos, indica filiação, data de
nascimento, essas coisas do gosto dos órgãos de informação.
Antônio
Jorge, de acordo com o Informe, teria deixado o "Jornal da Bahia" em
1976.
João
Carlos Teixeira Gomes, redator-chefe, "advertiu o grupo esquerdista, do
qual o mesmo fazia parte naquele jornal, indo para a 'Tribuna da Bahia', onde
se encontra até a presente data".
Não
se tome nada como verdadeiro.
Apenas
registro.
Informa,
en passant: Antônio Jorge fez parte do jornal "Invasão", "que
recentemente foi apreendido".
Em
minhas lembranças, não houve apreensão.
Mas,
posso me enganar
Acrescenta:
faz parte do movimento estudantil como aluno de Jornalismo da UFBA.
E
aí lembra dos tantos informes dos órgãos de segurança em que é citado, de
20/5/1976, 20/9/1976, 24/3/1977.
Como
se vê, era bem vigiado o nosso Antônio Jorge.
Já
nos deixou.
Não
pôde ler esse troféu.
Ficaria
orgulhoso.
Cuida
também de Oldack Miranda.
Citado
nos informes de 24/3/1977 e de 12/11/1973, informa-se houvesse deixado o
"Jornal da Bahia" em 1975, acompanhando saída "de elementos de
sua linha ideológica".
Seguiu
para a "Tribuna da Bahia" e logo retornou ao "Jornal da
Bahia", "onde se encontra atualmente".
Denuncia-o
como "amigo inseparável de Tibério Canuto, Dailton Mascarenhas, Césio
Oliveira e outros da mesma linha".
Às
noites, costumava "frequentar a casa de Dailton, na Ribeira".
Acrescenta:
"já esteve preso diversas vezes na Bahia e em Minas Gerais por
participação em movimentos esquerdistas".
Peço
desculpas ao leitor pelo detalhamento.
É
uma forma de compartilhar o olhar da repressão no período.
Quaisquer
dessas informações terão de ser checadas, claro.
Oldack
deve me dar depoimento sobre sua trajetória jornalística nas próximas horas.
Aí,
saberei distinguir verdade de invenção.
Importante
a registrar é a existência de uma vigilância constante sobre os passos de quem
a repressão considerasse de esquerda.
De
que modo isso era feito, não será fácil descobrir.
E
não é aconselhável especular.
Sem
dúvida, no entanto, éramos bem vigiados.
E
sequer percebíamos.
A
rigor, não estávamos preocupados.
Estávamos
tocando a vida.
Na
sequência, falam de Didico....
#MemóriasJornalismoEmiliano
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Emiliano
José
4
de janeiro 2020
Miltinho: bode
expiatório
Didico
era o codinome atribuído a Milton Mendes Filho pelo "Informe
Confidencial".
Recentemente,
José Carlos Zanetti e eu o visitamos.
Enfrentava
problemas de saúde.
Foi
um momento alegre.
Ele
nos reconheceu.
Sorriu.
Lembrou
de outros tempos.
Lembramos.
De
suas arrancadas impetuosas no precário campo de futebol da "Lemos
Brito".
De
suas matadas de bola elegantes.
Dribles
desconcertantes.
Era
bom no trato da redonda.
Nesse
dia, estávamos acompanhados de Rosália - Rosa Mendes, assim conhecida.
Foi
a primeira mulher de Miltinho, e do Departamento de Pesquisa da "Tribuna
da Bahia", mora na Itália tem tempo.
Miltinho,
preso por ser militante do MR-8, danou-se a fotografar logo ao sair da cadeia.
Trabalhou
em jornais, consagrou-se, e depois passou a fotografar para o movimento
sindical de trabalhadores.
É
citado em documentos dos órgãos de segurança em 16/2/1973, 20/2/1973, 20/5/1976
e 24/3/1977, segundo o tal "Informe Confidencial".
A
repressão atribuiu a ele um acentuado papel na crise do Marotinho.
Deu-o
como responsável pelo que chama de "conflito criado na Baixa do Marotinho
por ocasião das invasões naquele local".
O
Informe noticia o "farto noticiário dos jornais locais" a respeito do
Marotinho, "principalmente da 'Tribuna da Bahia', onde o referido
trabalha".
Houve
decisão de retirada de moradores de uma ocupação na periferia de Salvador, e
foi um pega-pá-capá dos diabos - polícia caiu pra cima dos moradores, houve
resistência, Alcebíades e Carmosina à frente - ainda estão vivos e fortes pra
contar no Novo Marotinho, na Estrada Velha do Aeroporto, para onde a população
foi transferida.
Foi
episódio a ficar para a história de Salvador. Padres Renzo e Paulo Tonnucci se
envolveram, o advogado Adelmo Oliveira, Trabalho Conjunto, Instituto dos
Arquitetos, entidades estudantis.
Até
o cardeal Dom Avelar Brandão Vilela intercedeu a favor dos moradores.
E
sobrou pra Miltinho.
Seu
crime foi fotografar.
O
cenário possibilitava excelente material.
Lindas
fotos, a revelar o drama habitacional de Salvador e especificamente o daquelas
famílias.
Ninguém
esperaria fosse a repressão buscar as causas reais do episódio.
Melhor
encontrar um bode expiatório.
Miltinho.
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Mônica Bichara: Saudade de
Miltinho, fizemos muitas pautas juntos, inúmeras em "invasões",
inclusive no Marotinho, qdo comecei a estagiar, em 79, Jorge Hage prefeito
indicado. Um doce de pessoa, sempre gentil, um revolucionário de verdade.
Espero que esteja melhor de saúde
Jose Jesus Barreto: Grande Miltinho
! Jogamos muitos babas. Era arisco. Bom e ousado fotógrafo. Amigo de vera,
querido. Saudades dele.
Rui Patterson: Miltinho, o
Didico, era também o Tatu? Já formado, em 1977, participamos de movimentos
periféricos, com os padres Tonucci, Renzo e Claudio Perani.
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Emiliano
José
5
de janeiro 2020
Documento
histórico
Esse
"Informe Confidencial" do CISA chegou às minhas mãos graças a Tibério
Canuto de Queiroz Portela.
Ele
vasculhava papelada do seu pedido de anistia, e deu de cara com esse material.
Afinal,
segundo a publicação, ele integrava o quinteto dirigente dos comunistas do
"Jornal da Bahia".
Os
cinco pretendiam agitar as redações.
Trazê-las
para o ideário comunista.
Oldack
Miranda, Tibério Canuto, Antônio Jorge, Dailton Mascarenhas e eu - eis os
perigosos comunistas, o quinteto infernal.
De
Milton Mendes, abordado ontem, o Informe passa para Aurora Lilian Lopes
Vasconcelos.
Não
tenho informação de Aurora seriamente envolvida em atividades de esquerda.
Não
significa nada.
Pode
ser fosse tão eficiente nas artes da clandestinidade que nos enganasse.
Nesse
caso, eu teria sido enganado.
Pode
ser.
Fato:
os órgãos de segurança botaram os olhos nela.
Aparecia
em informes de 24 de março e 20 de maio de 1977.
O
Informe registra: estava na "Tribuna da Bahia".
Ah,
para sustentar estivesse envolvida em atividades sediciosas, informa a
participação dela no jornal "Invasão".
Fui
dar uma olhada no livro "Os baianos que rugem...", e bingo, lá está
ela entre os quatro primeiros da redação: Ana Cristina da Cunha, Ana Maria
Fachinetti, Antônio Jorge Moura e ela, página 143.
Nesse
caso, o Informe não estava errado.
Integrava
a publicação subversiva.
O
CISA acrescenta, como agravante, o fato de ela ser "da mesma linha de
Antônio Jorge de Souza Moura".
Outra
vez, eu nunca soube da linha estratégico-programática de Antônio Jorge.
Eu
o tinha como homem de esquerda, repórter impetuoso, arrojado.
Mas,
"linha", conheci não.
Insisto:
devo outra vez ter sido ludibriado a bem da segurança.
Antônio
Jorge trazia seguidores para a 'sua linha", nesse caso discretamente,
também utilizando-se das artes da clandestinidade, contrariando seu
temperamento barulhento e explosivo.
E
assim colocou Aurora sob sua direção.
Há
mais coisas entre o céu e a terra do que pode imaginar nossa vã filosofia.
Volto:
não creiam cegamente em nada.
Já
alertei.
É
coisa desse Informe, dessa descoberta diabólica de Tibério Canuto.
Aurora
está aí, plena de juventude, nascida bem depois de mim e de Tibério, pode botar
as coisas em seus devidos lugares, havendo correções a fazer.
Documento
histórico a gente deve repercutir.
Estou
fazendo isso.
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Denilson
Vasconcelos:
Katia Madeiro. Veja a matéria
Tibério Canuto
Queiroz Portela:
Emiliano, de fato o documento faz parte do processo AN-2010, diligência 9919
832
Emiliano José: Tibério Canuto
Queiroz Portela Ótimo.
Mônica Bichara: Olha isso Aurora
Vasconcelos hehehe por menos de 3 anos eu não aparecia TB nesses informes como
perigosa comunista. Vcs TB, Jaciara Santos, Isabel Santos, Socorro Araújo.....
Jaciara Santos: Mônica Bichara
menina, quem diria, Aurora Vasconcelos, até tu? Rs rs rs
Aurora Vasconcelos: Jaciara Santos
Pois é. Eu não sei como me meteram lá, pois os citados eram do JB e eu da TB. E
eu nem gostava de política. Era existencialista. Que espiões incompetentes da
porra foram arranjar. E se meu pai tivesse sabido de uma coisa dessas? Quantos
inocentes não pagaram por inverdades desse tipo de arapongas de quinta? E o
pior: semi-analfabetos.
Me
irritou muito os erros ortográficos. Vontade de dar dois bofetes nesses(as) fdp
Aurora Vasconcelos: Mônica Bichara
Coisa de araponga de bosta.
Vitor Hugo Soares: No caso de
Aurora Vasconcelos, incluída no "documento histórico" a partir do
informe de araponga de meia pataca da participação dela no alternativo
"Invasão" - onde se dedicava a atividades sediciosas, segundo o
precário informante acho que posso e devo dar um depoimento. Sempre considerei
Aurora uma das melhores, mais competentes, antenadas e eficientes repórteres de
sua geração no jornalismo baiano. Sempre gostei (é assim até hoje) de ter
Aurora por perto, ou na redação ao meu lado quando o assunto é apurar fatos e
fazer jornalismo de qualidade. Foi assim na sucursal do Jornal do Brasil em
Salvador, no jornal "Invasão" e na Vejinha-Bahia, cuja implantação
coordenei quando chefe da sucursal da revista. Repórter de primeira, ´na
apuração dos fatos e no texto, foi isso que ela sempre fez, com brilho, em todas
estas publicações citadas. O mesmo acontecia com o saudoso Antônio Jorge Moura,
que um infarte levou prematuramente. Em sua honra e memória, cito um fato
marcante do jornalismo na Bahia e no País. Recebi na redação da sucursal do JB,
a dica de que algo grave estava acontecendo na Casa de Detenção no quase fim da
ditadura. Antonio Jorge estava ao meu lado na redação do JB. Pedi que ele fosse
verificar o que estava acontecendo. Ele foi e voltou com um dos maiores furos
da imprensa baiana e nacional na época: a fuga de Teodomiro Romeiro, primeiro
condenado à morte pela ditadura no Brasil. Furo internacional que, graças a
Antonio Jorge, fizemos chegar na sede do Jornal do Brasil, no Rio, antes do
governador Antonio Carlos Magalhães tomar conhecimento da fuga no Palácio. É
isso, com meu abraço em Aurora e minha saudade de Antono Jorge.
Aurora Vasconcelos: Vitor Hugo
Soares Obrigado pelo afeto e respeito. Vc tem a minha admiração não só pelo
excelente profissional que sabe ser como pela pessoa integra e amável. Abs
carinhosos
Isabel Santos: Pois é. Quase,
quase, Mônica Bichara.
Socorro Araújo: Essa é ótima!
Aurora Vasconcelos: Socorro Araújo
Surpreeesaaaa? Imagine eu....
Aurora Vasconcelos: Eu já tinha
visto. Tibério me mandou. Fiquei mais que perplexa. Nunca pertenci a nenhum
partido ou grupo político e não era nem próxima de nenhum dos " perigosos
esquerdistas". Meu relacionamento com eles, inclusive com Antonio Jorge,
era de simples cumprimentos. Não sei o que meu nome estava fazendo lá.
Mistério...
Apenas
trabalhei em jornais de oposição.
Portanto,
não lhe enganei Emiliano, rsrs, enganei ao espião com o meu jeitinho sonso de
subversiva.
Emiliano José: Aurora
Vasconcelos É, o espião a imaginou perigosa, sonsa, sonsa, enganando até os
tiras, a ponto de produzirem relatórios sobre suas "atividades". A
ditadura tinha cada araponga, viu?
Aurora Vasconcelos: Emiliano José
Pois pois. Não imagino quais seriam as atividades. Mas gostaria de saber quem
foi o infeliz que enchia o sistema de segurança com informações sem fundamentos.
Emiliano José: Difícil
descobrir, Aurora. Também gostaria muito de saber.
José Umberto Dias: a
clandestinidade em sendo le charme discret de la petit bourgeoisie
Rui Patterson: Um retorno ao
passado desses e vcs -alguns - nem assumem! Se os "homens" disseram
que são-foram perigosos esquerdistas, levem pra seus currículos!
Aurora Vasconcelos: Rui Patterson
Não se pode nem se deve assumir o que não é verdade. Falo por mim.
Rui Patterson: Aurora
Vasconcelos, fazendo as devidas ressalvas? Pq vc foi realmente fichada.
Aurora Vasconcelos: Rui Patterson
Soube disso recentemente, o que mostra o perigo das ditaduras, onde as pessoas
são fichadas inocentemente. Minha atuação, durante esse período nefasto da
nossa história, foi sempre dentro da minha profissão de repórter. Numa
democracia, isso não é crime, nem motivo para fichas. Afinal, ditaduras não são
regimes onde os direitos e a verdade dos fatos sejam levados a sério.
Nada
devo. Sequer explicações ao senhor ou a quem quer que seja.
Isabel Santos: Muito
interessante. Só sei de uma coisa: esse Emiliano José é um retadão. Essa série
de #MemóriasJornalismoEmiliano está maravilhosa de informações. E, DITADURA
NUNCA MAIS.
Emiliano José: Isabel Santos 😘, querida Isabel.
Mônica Bichara: Hoje a gente até
acha graça e brinca com esses enganos, como a inclusão de Aurora Vasconcelos
que nem sequer era do JBa. Mas isso mostra quantos absurdos e injustiças a
ditadura é capaz de produzir, perseguindo não só quem de fato lutava contra o
regime em busca de uma vida mais justa para todos
Aurora Vasconcelos: Mônica Bichara
Já pensou? Quantas pessoas foram torturadas sem saber do que se tratava? Me
lembro do assassinato de Vladimir Herzog.
Mônica Bichara: Aurora Vasconcelos
claro, um risco que todos correm nesses regimes. Basta eles invocarem com
alguém, interpretarem alguma mensagem errada....Estava lendo a Pg. 2 diz que vc
era da TB e os perigosos comunistas tentavam te seduzir, junto com Jolivaldo Freitas kkkkkkkk esse sempre foi
perigoso) e outros
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Emiliano
José
06
de janeiro 2020
Césio
Césio
Antônio Ferreira de Oliveira é o próximo da lista do Informe do CISA.
Surpreso,
fiquei surpreso com as escassas quatro linhas dedicadas a ele.
Além
da filiação, relembra ter sido citado em documento do Departamento da Polícia
Federal de 24/3/1977.
Estava
vigiado, mas nem tanto.
Curioso.
Os
órgãos de segurança teriam razões para dar mais atenção a ele.
Fora
militante na Escola Técnica Federal ao lado de vários comunistas.
Militante
e liderança.
Teve
eleição consagradora para presidente do grêmio da escola.
Assim,
não era um qualquer.
Quem
sabe, os órgãos de segurança já o considerassem conhecido o suficiente.
Não
precisavam mais de informações.
Vá
se saber os critérios adotados.
E
também devia depender do tipo de araponga.
Subestimado
nesse Informe.
Já
estivera frente a frente com o major Nilton Cerqueira quando secretário de
Redação da "Tribuna da Bahia", em episódio já contado nessa série.
Dele,
ressalto a qualidade profissional, o talento, a serenidade, a capacidade de
chefiar equipes.
Não
fez faculdade.
Sua
escola foi a "Tribuna da Bahia", desde a Escolinha.
Ascendeu
rapidamente.
Era
um texto leve, elegante, avesso a ranços tradicionais.
Sabia
editar como poucos.
Uma
queda especial para produzir títulos espirituosos, manchetes instigantes.
Um
grande jornalista, vida dedicada à atividade.
Eu
o conheci de perto.
O
primeiro encontro deu-se em 1975.
Leu
série feita por mim na "Tribuna da Bahia" sobre o processo de
libertação das colônias africanas do domínio português, e me chamou para o
"Jornal da Bahia", onde ocupava cargo de chefia.
A
série sobre Angola, Moçambique, Guiné Bissau, Cabo Verde, aconteceu no final de
1974, no início de minha caminhada jornalística.
Gostou
e me levou.
Mais
tarde, não muito, vamos nos encontrar na memorável redação do
"Estadão", chefiada por Carlos Navarro Filho, repórteres os dois.
Depois,
soube dele em tantas atividades no campo da comunicação política.
Ah,
dirigiu o "Jornal da Pituba", de muito sucesso, não obstante de vida
curta.
Sua
obsessão era, creio seja ainda, o jornalismo.
Eu
o conheci assim.
Não
mais como militante.
O
que não o tornava menos perigoso aos olhos da repressão.
Bastava
ser jornalista para ser suspeito.
No
ano de 1977, parece, estavam preocupados com outros, e o deixaram mais à
vontade, não inteiramente, como vimos.
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Cesio Oliveira: Nem perceberam
que fui eu quem contratou a perigosa equipe subversiva para a reportagem do
Jornal da Bahia: Emiliano José, Oldak Miranda, Tiberio Canuto, Denilson
Vasconcelos, Carlos Prata, Dalton Godinho, Carlos Zanetti, Dailton Mascarenhas
e Antonio Jorge Moura, esses dois últimos os único que não eram ex-presos
políticos. A Lemos Brito toda na Barroquinha. Joca estava afastado para
tratamento de saúde. A direção do projeto de construção de uma nova Redação era
de Gustavo Tapioca.
Emiliano José: Cesio Oliveira
Passaram batido...
Emiliano José: Ainda bem...
Denilson
Vasconcelos:
Aê Cesio Oliveira. Boas lembranças de ti. Um abraço.
Mônica Bichara: Meu vizinho
Cesio Oliveira, não sabia q vc era tão "perigoso" kkkkk Grandes
revelações
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Emiliano
José
07
de janeiro 2010
Obrigado, Gordo!
É,
a repressão passou batida.
Césio
agachadinho agachadinho sem barulho feito um bom vietcong foi rompendo
barreiras enchendo a redação de comunistas.
Certamente
há estudos a respeito da presença de comunistas na imprensa durante a ditadura.
O
assassinato de Vladimir Herzog, em 1975, jornalista competente, tornou essa
presença mais visível.
Era
do PCB.
Caiu
na esteira da Operação Radar, trágica ofensiva da ditadura.
Foram
mortos mais de 20 dirigentes do PCB.
Falo
no PCB, mas esclareço: a origem dos jornalistas de esquerda era variada.
Boa
parte deles não estava necessariamente ligada a nenhuma organização
revolucionária.
O
jornalismo era um meio de ganhar a vida.
Os
empresários da comunicação tinham razões para preferir jornalistas de esquerda.
Em
geral, tinham sólida formação cultural, e isso era, é, essencial ao exercício
da profissão.
Conheciam
História.
Sem
ela, jornalista tropeça.
Eram
disciplinados no cumprimento das tarefas confiadas a eles.
Em
geral, sabiam escrever.
Tinham
senso ético.
Conheciam
os limites da, vá lá, imprensa burguesa.
Em
geral, tornavam-se bons profissionais.
Não
superiores aos colegas com outras visões políticas, mas bons.
A
movimentação do Gordo - Navarro, mestre em apelidos, o chamava assim pelos
quilinhos a mais - deve ter levado tudo isso em consideração ao ir chamando os
comunistas para o "Jornal da Bahia", sob o olhar cúmplice e ativo de
Gustavo Tapioca, em cargo de direção naquele momento, cobrindo a ausência de
João Falcão.
Claro,
o Gordo matava dois coelhos de uma só cajadada.
Era
solidário com seus companheiros, de um lado.
Não
estava mais diretamente vinculado à luta política direta, mas nunca deixara de
lado seus ideais de esquerda.
Queria
ser solidário, e foi.
E
ao mesmo tempo, de outro lado, fortalecia a redação com profissionais
responsáveis e dedicados.
Originários
das prisões, levou Tibério Canuto, Oldack Miranda, Dalton Godinho, José Carlos
Prata, José Carlos Zanetti, Denilson Vasconcelos, eu próprio.
De
cambulhada, levou ainda Antônio Jorge e Dailton Mascarenhas, também jornalistas
de esquerda, embora não egressos de prisão.
Era
1975.
Constituiu
uma redação de esquerda.
Muitos
dos novos e das novas jornalistas entraram no clima e se fez um vigoroso
jornalismo durante bom tempo.
E
Césio teve grande responsabilidade em tudo isso.
Devo
dizer: obrigado, Gordo!
O
jornalismo baiano deve muito a você!
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Mônica Bichara: Chico
Vasconcellos e Jose Jesus Barreto tb, não? Ainda alcancei boa parte desses
perigosos comunistas no JBa. Graças a Deus hehehehe
Jose Jesus Barreto: Mônica Bichara
eu era da "festiva" rsrsr
Chico Vasconcellos: Mônica Bichara
Sonhávamos com um mundo melhor.
Cesio Oliveira: Valeu, Zapata.
Não sei se foi Pedro Bó ou Navarrinho quem cravou esse apelido na nossa época
de Estadão. Mas valeu, Emiliano.
Gustavo Tapioca: Agradeço pela
lembrança. Nos vemos amanhã às 10h.
Lucia Correia Lima: O bom preparo
intelectual da esquerda e sim, a disciplina, levou o ACM quando fundou ao
jornal Correio da Bahia à dizer: "vou contratar a esquerda toda!".
Dito e feito. Muitos foram.
Carmela Talento: Devemos muito a
Césio Oliveira formou uma equipe que fez história no jornalismo
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Emiliano
José
8
de janeiro 2020
Outro vietcong
Recentemente,
nos falamos.
Queria
a biografia sobre Waldir.
Recebeu-a,
autografada.
Jolivaldo
foi o alvo seguinte do "Informe Confidencial" do CISA.
Jolivaldo
da Cruz Freitas.
Nascido
em dezembro de 1953.
Quando
a repressão botou os olhos nele, tinha 22 anos.
Divulga
um documento de 20 de maio de 1976 onde registra atividades subversivas dele.
É
acusado de participar do "esquema".
Ou
seja, estava articulado com os comunistas,. principalmente com os do
"Jornal da Bahia" certamente.
Não
o conheci tão intimamente, embora amigos.
Não
o vejo, não obstante possa me enganar, como militante de esquerda.
Talvez,
quem sabe, um simpatizante à distância.
Mas,
havia os vietcongs, aqueles a preferir a clandestinidade.
Nós,
os recém-saídos de prisão, optamos sempre pela atuação aberta, à luz do sol.
Não
tinhamos nada a esconder.
Éramos
tão somente profissionais ganhando a vida, na mais absoluta legalidade.
O
coronel Luiz Arthur de Carvalho, secretário de Segurança, ex-superintendente da
Polícia Federal, o que me enviara à tortura, pediu a minha cabeça ao
"Jornal da Bahia".
A
direção do jornal resistiu.
A
cabeça permaneceu no lugar.
Continuei
trabalhando.
Sim,
podia haver os clandestinos.
Jolivaldo
podia ser do "esquema" e enganar até a nosotros.
Uma
eficaz atuação vietcong.
Naquele
momento, 1977, segundo o Informe, estava no "Diário de Notícias".
É
acusado de produzir um sem-número de matérias mentirosas sobre a civilizada
polícia baiana.
Talvez
sua insidiosa atuação caminhasse por aí: desgastar o aparelho de Estado,
particularmente a briosa polícia.
Chegou
a apresentar queixa contra a polícia.
Registrada
na 1ª C.P., a ocorrência revela agressão de um policial militar durante as
manifestações estudantis de 19 de maio de 1977.
A
agressão resultou em fratura num dos braços.
A
ocorrência diz "consta" fratura.
De
repente, o sujeito está apenas simulando para incriminar soldados no desempenho
de sua sagrada missão de reprimir subversivos.
Jolivaldo
deve ler esse texto.
Espero.
Passado
tanto tempo, pode falar do passado sem receio.
Como
era sua participação no "esquema".
Não
vão mais quebrar o seu braço.
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Mônica Bichara: Esclarece aí,
perigoso Joly Jolivaldo Freitas. Não sabia q vc era comunista
Jaciara Santos: Tiiiiiiiio....
Até tu?
Mônica Bichara: Se soubesse nem
tinha autorizado ser meu imitador oficial. Vai que os caras encasquetam que eu
sou comunista TB.....Deus me livre
Jaciara Santos: e ele, nem
tchum, pra nós...
Mônica Bichara: Jaciara Santos
esse Jolivaldo Freitas tá se fazendo de sonso agora q descobrimos a verdadeira
missão dele. Confessa aí, homi. Ou será q foi outra barrigada dos agentes,
igualzinha a se Aurora Vasconcelos?
Aurora Vasconcelos: Os bundões
incompetentes precisavam mostrar serviço
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Emiliano
José
9
de janeiro 2020
Mariluce, força de
mulher
O
alvo seguinte do "Informe Confidencial" é Mariluce Moura.
Eu
a conheci logo ao chegar à Bahia, em 1970.
Na
condição de dirigente de AP, ela ainda estudante de jornalismo.
Eu
dava assistência ao movimento estudantil.
Desde
lá, nos tornamos amigos.
Dela,
falo com emoção.
Por
enquanto, não trato do jornalismo.
E
deixo o "Informe" momentaneamente de lado.
Seu
amor, Gildo Macedo Lacerda, foi assassinado pela ditadura.
Foram
presos, ele e ela em 22 de outubro de 1973.
Ela
trabalhava no "Jornal da Bahia".
Na
sucessão de quedas na Bahia, Oldack Miranda também é preso.
Mariluce
e Gildo são separados na noite do dia 22 de outubro.
Ainda
pôde lançar um último olhar para Gildo, amoroso e angustiado.
Olhar
de quem nada podia.
Nunca
mais o veria.
Ontem,
Gustavo Tapioca e eu conversávamos sobre esse episódio trágico.
Gildo
e Oldack são levados para Recife.
Destroçado
por torturas, Gildo é assassinado.
Entrou
no rol dos desaparecidos políticos, vítima da ditadura.
Mariluce
estava grávida de poucas semanas.
Tessa
nunca conheceu o pai.
É
professora de filosofia na USP.
Gildo
é morto numa operação sangrenta da ditadura.
A
atuação de um "cachorro", Gilberto Prata, orientou a repressão na
busca dos principais dirigentes de Ação Popular Socialista, organização
revolucionária de combate à ditadura, cumpre enfatizar.
Mataram
sete deles entre outubro de 1973 e fevereiro de 1974.
Ao
"cachorro" se devem as mortes e desaparecimentos de Paulo Stuart Wright,
Eduardo Collier Filho, Humberto Câmara Neto, Fernando Santa Cruz, Honestino
Guimarães, José Carlos Novaes da Mata Machado e dele, Gildo.
Vamos
ter chance de conhecer a história desse massacre brevemente.
Virá
em livro escrito pelo ex-ministro Nilmário Miranda, irmão de Oldack.
Gildo
foi anistiado em 30 de outubro de 2008.
Sua
memória, honrada.
Mariluce,
sabe-se lá como, conseguiu reunir forças e seguir a vida.
Tornar-se
brilhante profissional.
Para
mim, um exemplo.
Depois
de cumprir pena, eu a reencontro.
E
ela foi uma das pessoas a me dar régua e compasso no jornalismo.
O
escritor francês Leon Bloy disse acertadamente, recorro constantemente a ele:
"Sofrer
passa. Ter sofrido não passa nunca".
Experiências
como a de Mariluce jamais são esquecidas.
Estão
lá, na alma.
Mas,
a vida não para.
Mariluce
tem uma força singular, de mulher singular.
Amanhã,
volto ao "Informe Confidencial".
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Mônica Bichara: Esse caso é uma
das páginas mais escabrosas da ditadura. E pensar que muitos querem reviver
esses tempos, é de doer na alma
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Emiliano
José
10
de janeiro 2020
De pé,
"apesar de você"
O
"Informe Confidencial" do CISA fala em dois documentos referentes a
Mariluce Moura.
Um,
de 12 de novembro de 1973.
Outro,
de 21 de janeiro de 1974.
O
informante apenas cita.
Nunca
informa conteúdos.
Difícil
imaginá-los.
Os
dois, muito próximos às prisões, à morte e desaparecimento de Gildo Macedo
Lacerda.
Certamente,
depois de presa e solta, Mariluce estava ultravigiada.
É
revoltante a forma como o Informe se refere a Gildo.
Trata-o
como amante de Mariluce.
O
"subversivo Márcio", nome frio emprestado a ele pela repressão.
Na
sucessão de invenções caluniosas, informa ter sido morto "num tiroteio com
a Polícia Federal".
Já
contamos, e se sabe: Gildo foi levado para Recife, sob ordens do coronel Luiz
Arthur de Carvalho, atendendo pedido do Exército.
Lá
foi torturado brutalmente.
Até
morrer.
Lá
desapareceram com seu corpo.
A
covardia é uma das características das ditaduras.
A
brasileira matou muita gente.
Sempre
covardemente.
Na
tortura.
Assim,
com Gildo.
Informa-se
a presença de Mariluce em "O Globo", no Rio de Janeiro, depois do
assassinato de Gildo.
E
ensinando na PUC.
Depois,
voltando a Salvador, ali pelos meses de fevereiro ou março de 1977.
Passaria
a trabalhar na sucursal de "O Globo", em Salvador.
E
digo passaria porque não sei da veracidade das informações.
Não
tendo nada a dizer dela, fala generalidades.
"Sempre
que pode faz restrições ao regime", escreve o informante.
Mariluce,
naquele momento, alma ferida, devia seriamente se limitar a seus afazeres
profissionais.
Não
creio estivesse empenhada em "fazer restrições ao regime", não
obstante, por todas as razões, tivesse-as de sobra.
E
trabalhava em "O Globo", cujos limites editoriais eram claros.
Acentua,
contraditoriamente: Mariluce prefere falar pouco, "sobretudo em presença
de pessoas que não fazem parte do 'esquema'".
Davam-na,
portanto, como integrante do "esquema" montado a partir do
"Jornal da Bahia", o ninho de comunistas montado pelo Gordo, o
querido Césio Oliveira.
Não
sei a reação de Mariluce a tudo isso.
Talvez
de justa indignação.
Talvez
sorria diante de tanta besteira, tanta indigência.
Ela
me dirá.
Parece
alterne hoje atividades profissionais na Bahia e em São Paulo.
Jornalista
requisitada, sempre.
De
pé.
As
dores da existência, grandes, não a derrotaram.
Persistiu
a acreditar na vida.
"Apesar
de você"...
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Mônica Bichara: Impressionada
com os detalhes desse relatório confidencial.....Belo resgate, Emiliano José
Lucia Correia Lima: Era free na
sucursal do Globo e Luce trabalhava lá sim. Era Osvaldo Gomes o chefe. Foi qdo
indiquei João Santana ( acho que Nadja também fez o mesmo) para tirar as férias
de Mazzei. Osvaldo percebeu a capacidade de João, lhe contratou e pouco tempo
tempo qdo o prefeito Mario Kertész criou a secretária de comunicação e convidou
Osvaldo, este colocou João no seu lugar para mágua ou incompreensão de todos da
equipe que lá estavam há muito mais tempo. Lembro de Mariluce, Mazzei, Renato
Pinheiro um que hoje é prof de jornalismo de uma faculdade. O Teixeira. Foi
duro para João enfrentar este ciúmes mas logo ele transformou a sucursal na
melhor do país.
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Emiliano
José
11
de janeiro 2020
Papa Capim
Tibério
é o próximo alvo do "Informe Confidencial".
Tibério
Canuto de Queiroz Portela.
Nascido
em Quipapá, Pernambuco.
Um
mês depois de mim, março de 1946.
Acerta
quando o situa como integrante da direção regional de AP na Bahia.
Quando
revela ter sido preso.
Em
maio de 1971.
Erra
o nome de Antônio Rabelo - fala em "Antônio Mabello".
De
onde tirou esse nome, ninguém há de saber.
Caíram
ele, Renato Godinho Navarro e Rabelo, os três do CR/6 - Comando Regional 6, de
AP, correspondente à Bahia e Sergipe.
"Foi
processado em Brasília em decorrência de atividades da UNE".
Que
eu saiba, não
Tibério
há de esclarecer.
Toda
a atividade dele no movimento estudantil esteve vinculada ao movimento
secundarista.
Julgado
e condenado a 30 meses de reclusão pela Auditoria da 6ª Circunscrição
Judiciária Militar, Bahia, não sei se abrangia Sergipe também.
Sai
da prisão em setembro de 1973.
Direto
para o "Jornal da Bahia".
Em
junho de 1977, mês do relatório, continua no jornal.
Curioso:
informa-se de uma relação exclusiva dele com Oldack Miranda e Dailton
Mascarenhas.
Frequentava
a casa de Dailton, dizia o relatório.
Besteira.
Se
o fizesse, só esporadicamente.
Morava
com Oldack Miranda, no Stiep.
Ele
e a mulher.
Oldack,
também casado.
E
Tibério era dos que tinham relações amplas.
O
tal relatório situa Tibério acompanhando "com vivo interesse o movimento
estudantil".
Sei
lá o significado disso.
Tibério
não tinha mais qualquer relação com a movimentação estudantil.
Do
que sei, ao menos.
Vai
ver ainda dava alguma assistência aos novos militantes estudantis de uma AP a
teimar em sobreviver, e sobreviveu durante algum tempo.
Não
sei.
Ele
pode esclarecer.
Na
prisão, recebeu o apelido de Papa-Capim.
Não
sei o autor.
Talvez
Odilon Pinto, Cebola.
Nem
sei a razão.
Talvez
pelo cabelo loiro.
Sarará,
na verdade.
Deixou
crescer uma respeitável cabeleira, ao modo black power.
Não
sei se à época era simpatizante dos Panteras Negras
Formou
comigo uma boa dupla de zaga no time de futebol da "Lemos Brito".
Boa,
elogio gratuito.
Éramos
duros, isso sim, daqueles zagueiros respeitados muito mais pelo natureza rude
do que pelo trato elegante com a bola: a menina podia até passar,.o jogador,
não. Tentasse firulas, era um corpo estendido no chão...
No
jornalismo...
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Tibério Canuto
Queiroz Portela:
Atendendo os esclarecimentos solicitados 1) Respondi a um processo em Brasília,
por confusão dos órgãos de informação que me xolocaram como um dos responsáveis
pelas agitaçôes estudantis no Distrito Federal, jubto com Luiz Travassos e Luiz
Raul. Detalhe: jamais estive em Brasília nos meus tempos de liderança
secundarista.. 2) O documento faz confusão com a minha primeira prisãobem 1966,
na Central do Brasil, quando ia me dirigia a Belo Horizonte para levar uma
saudação dos secundaristas ao 28° Congresso da UNE, que elegeu José Luiz
Moreira Guedes. 3. Creio que quem deu o apelido de Papa Capim foi Índio, um
preso comum.
Tibério Canuto
Queiroz Portela:
No período abordado pelo informe do CISA eu tinha, de fato, contato com o
pessoal da Nova Ação, que vendiam Movimento na UFBA, e, deppis, o Em Tempo.
Isso se dava sobretudo por meio de Jorge Almeida (Macarrão), Vacareza e
Pedroso, que me tinham como conselheiro. Não havia AP reorganizada. O que
tínhamos era um grupão do qual vocé e outros ex presos políticos participavam.
É esse grupão que dá sustentação a Movimento e depois Em Tempo
Emiliano José: Tibério Canuto
Queiroz Portela Ótimos esclarecimentos.
Tibério
Canuto Queiroz Portela: O Grupão era uma organização horizontal e plural.
Emiliano
José: Isso
Tibério Canuto Queiroz Portela:
Emiliano, acho que você vai levar um esporro de Gil quando ela ler seu texto
por colocá-la como minha mulher. Cuidado com o identitarismo feminista.
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Emiliano
José
12
de janeiro 2020
Persistência e
solidariedade
Quando
Tibério Canuto de Queiroz Portela sai da prisão no segundo semestre de 1973, vê
no jornalismo um meio de ganhar a vida.
Procura
Gustavo Tapioca, diretor de Redação do "Jornal da Bahia".
É
admitido.
Tapioca
agiu solidariamente.
Sabia
das dificuldades de um sujeito saído da cadeia, e sem eira nem beira.
Já
se conheciam.
Tapioca
fora militante de AP.
Do
movimento secundarista.
Tibério
se articulara com ele e José Sérgio Gabrielli de Azevedo quando da preparação
do congresso da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES).
Reuniu-se
com eles no final de 1966,.em Salvador.
O
congresso da UBES realizou-se no Rio de Janeiro, em abril de 1967, e o delegado
destacado por AP foi Gabrielli.
Tibério,
eleito presidente, trabalhou no decorrer de 1967, para que Tapioca o sucedesse
na presidência da UBES.
Considerado
por Tibério como o "melhor quadro da nova geração na Bahia".
Não
aconteceu.
Tapioca
viu-se numa dessas encruzilhadas da vida: estava prestes a se casar e a AP
propunha a ele integrar-se à produção ou assumir a dianteira no movimento
estudantil.
Ir
trabalhar como operário numa fábrica ou como trabalhador rural no cacau.
Ou
assumir a direção da UBES.
Relutou.
Mas,
decidiu casar-se e dar outro rumo na vida.
O
sogro, João Falcão, oferece a ele a oportunidade de ser diretor de Redação.
Aceitou
e saiu da militância direta.
Nunca
deixou de lado suas convicções.
Tibério,
no início, enfrentou dificuldades.
Não
sabia nada de jornalismo.
Ia
aos trancos e barrancos.
Editores
foram a Tapioca: não dá, é melhor demitir.
-
Não, nada de demitir. Vamos ajudá-lo. Sei do potencial dele.
Tibério
se esforçou no limite, e logo, logo estava como editor de Economia.
No
ano de 1977, segue para São Paulo, onde será um dos principais jornalistas de
"Em Tempo", depois de "Movimento".
O
"Em Tempo" na Bahia aglutinou um grupo numeroso de pessoas de
esquerda, e um grande número de jornalistas.
Exercemos
influência no jornal.
Conseguimos
emplacar a ida de Tibério para São Paulo, sede da publicação.
Tibério
seguirá ganhando a vida como jornalista.
Deve
isso à sua tenacidade em aprender.
E
inegavelmente à solidariedade de Tapioca.
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Tibério Canuto
Queiroz Portela:
Sou eternamente grato a Gustavo Tapioca. Sem a sua solidariedade dificilmente
chegaria aonde cheguei. Além de tudo, Gustavo abriu as portas para vários
ex-presos politicos que ao sair da cadeia não tinham profissão.
Gustavo Tapioca: Forte abraço,
Tiberio. Meu presidente.
Oldack Miranda: Todos os
ex-presos políticos da ditadura devem muito a Gustavo Tapioca. Saídos da
prisão, precisávamos trabalhar. O Jornal da Bahia acolheu a todos.
Gustavo Tapioca: Forte abraço,
Oldack. Já disse ao Emiliano que precisamos nos ver e voltar a beber juntos.
Abração e obrigado pelos exageros.
Tibério Canuto
Queiroz Portela:
Grande abraço, Gustavo Tapioca. Nós todos que estivemos na trincheira do Jornal
da Bahia e aí iniciamos nossa profissão temos uma eterna dívida de gratidão a
você. Já tinha dito isto a Emiliano, assim que chegou em minhas mãos o informe
do CISA.
Mônica Bichara: Cheguei ao JBa
no final de 79 para estagiar, mas lembro que esses nomes eram apontados como
exemplo, como referência. Que escola fantástica foi o Jornal da Bahia, pra toda
a vida, não só de jornalismo
Antonio Ibanez
Ruiz:
Estou confirmando o meu orgulho de poder beber uma cerveja, de vez em quando,
com o nosso Amigão GT. Abraços e saudades
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Emiliano
José
13
de janeiro 2020
Ontem como hoje,
jornalistas são inimigos
Vou
lendo e concluindo o quanto é pobre, indigente, o tal "Informe
Confidencial".
Ainda
bem.
Nos
deixavam mais à vontade.
Pra
fazer jornalismo.
As
informações são desencontradas.
Informam
pouco.
Desinformam,
às vezes.
Sobre
mim, erra até data de prisão.
E
não acompanha corretamente minhas andanças profissionais.
Erra
o nome de Joca - a Bahia sabe chamar-se João Carlos Teixeira Gomes.
Durante
todo o texto, chama-o de José Carlos Teixeira Gomes.
É
citado num documento de 24 de março de 1977.
A
ele são dedicadas escassas duas linhas.
Nesse
dia, o informante trabalhou bastante: há documento também sobre Dailton
Mascarenhas.
Revela:
Dailton estava no "Jornal da Bahia" em 1975 "como um dos
principais elementos de um grupo de esquerda que crescia no jornal".
Foi
para a "Tribuna da Bahia" e depois para o "Diário de
Notícias", "onde liderou um movimento do pessoal da redação contra os
diretores por causa de um atraso no pagamento de salários, o que motivou na
saída de muita gente do jornal". (sic).
Voltou
para o "Jornal da Bahia", "onde está ao lado de Tibério Canuto e
Oldack Miranda, acompanhando de perto todo o movimento estudantil".
Houve
reuniões na casa de Dailton, na Ribeira.
Fornece
o endereço: Rua Júlio David, 6.
Já
disse: não se pode tomar tais informações como verdadeiras.
Quem
for estudar o período, terá um duro trabalho de checagem.
Raimundo
Mazzei é brindado com escassas linhas para se informar ser do
"esquema", trabalhar n'O Globo', e ter interesse no movimento
estudantil.
Pulam
pra João Neiva.
Estava
na "Tribuna da Bahia".
Era
da "esquerda festiva", pobre do Neiva.
Fugiu
de São Paulo por problemas políticos e veio dar com os costados na Bahia, onde
estava havia apenas dois anos.
Já
se disse: ele tinha um gozo especial ao esculhambar a polícia - assim o
informante o via.
Estudava
Jornalismo na UFBA.
É
primeiro-secretário do Diretório Acadêmico.
Militante
da porra.
O
documento difundido sobre ele também é do dia 24 de março de 1977.
Pedro
Formigli, com quem trabalhei no "Estadão", é citado para lembrar de
uma queixa na 1ª C.P. sobre uma agressão sofrida por ele por parte de um
soldado da PM quando cobria manifestação estudantil de maio de 1977.
Isnaia
Junquilho Freire entra no Informe como Pilatos entrou no Credo.
Prima
de Oldack, ela o acolhera quando chegou de Minas, saído da prisão, início dos
anos 70.
Está
relacionada.
Nunca
foi jornalista.
Desse
"Informe Confidencial" pode-se concluir:
a
ditadura via os jornalistas como inimigos.
O
atual presidente da República os vê da mesma maneira, sem tirar nem pôr.
Inimigos
precisam ser vigiados.
Cuidar-se
dos ataques deles.
No
caso da Bahia, o araponga era muito fraco.
Quem
terá sido?
Nunca
vamos saber.
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Mônica Bichara: Agora então. .
.pra esse governo medíocre, somos os inimigos preferenciais. A história se
repete
Joana D'arck: Sempre assim.
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Emiliano
José
14
de janeiro 2020
Saltando a
fogueira
Essa
série está me levando a muitas descobertas.
A
trajetórias antes desconhecidas.
Ou
só resvaladas.
Sabia
alguma coisa do jornalista Gusttavo Falcón.
Convivera
com seu irmão, Peri Falcón, na "Lemos Brito".
Dona
Bárbara, sua mãe, nos visitava na cadeia.
Não
conhecia, no entanto, a própria odisseia política dele.
Desde
muito jovem, militante.
No
Colégio "Severino Vieira" integra o grêmio, já pertencente à Polop,
organização revolucionária.
Participa
na linha de frente das manifestações de massa dos secundaristas de Salvador no
final da década de 1960.
Militante
comunista, amplia seu raio de ação.
Chega
a vários colégios da capital e a muitos do interior.
Entra
de cabeça na rearticulação da Associação Baiana de Estudantes Secundaristas
(ABES) e União Brasileira de Estudantes Secundaristas (UBES).
Era
o porta-voz dos interesses dos estudantes do "Severino Vieira" e o
defensor da linha política defendida pela Polop.
Em
1968, lidera a primeira ocupação organizada durante uma greve num colégio
secundário na Bahia.
Sentiu-se
no fogo da Revolução.
Foram
40 dias de ocupação.
Dias
heróicos, assim os enxergava.
Atividades
culturais, didáticas, científicas e políticas.
Foi
projetado como liderança.
A
repressão botou uma lupa em cima.
Ficou
preocupada com aquela inovadora forma de fazer política.
Atraía
a massa.
Fazia
crescer sua consciência política.
Colocava
os estudantes contra a ditadura.
É,
mas a ditadura não viera para brincar.
O
AI-5 chegou com toda sua violência, 13 de dezembro de 1968.
Gustavo
foi expulso
E
proibido de estudar em colégios públicos.
Além
de queda, coice.
Com
16 anos, precisava cuidar da vida.
Sobretudo,
estudar.
Família
pobre, contou com a ajuda de amigos e parentes para custear a conclusão do curso
médio, feito no Colégio "Atheneu Sergipense", em Sergipe, valendo-se
do expediente acelerado do "Madureza".
Nessa
modalidade, era possível concluir o curso médio rapidamente.
Eu
próprio me vali desse recurso no ano de 1967.
Saltou
a fogueira: voltou de Sergipe com o diploma do curso médio nas mãos.
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Denilson
Vasconcelos:
Grande figura, ao lado de quem tive o prazer de trabalhar no IC Shopping News.
Numa época em que este tipo de publicação não precisava ser shopping lixo.
Zeca Peixoto: Que história!
Mônica Bichara: Cada capítulo
dessa história é mais impressionante que o outro. Estou juntando todo também
para postar editado com os comentários no Pilha Pura
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Emiliano
José
15
de janeiro 2020
Perigosos
secundaristas
Gustavo
Falcón não abriu mão da participação política.
Fora
da escola pública, encontrou saída concluindo o colegial valendo-se do
"Madureza".
Dirigente
do Comitê Estudantil Secundarista da Polop, propôs em plenária de sua base, a
criação do Movimento de Organização e Luta (MOL).
Tratava-se
de arregimentar nas escolas estudantes simpáticos à luta contra a ditadura,
naquele momento perdidos diante de tanta repressão.
Estavam
sem orientação alguma, não obstante desejosos de participarem da luta.
O
movimento proposto por Gustavo foi aprovado pela base secundarista e pela
direção estadual da Polop.
A
direção dessa iniciativa contava, ainda, com a participação, entre outros de
Manoel Falcón Marino Neto, um dos irmãos comunistas de Gustavo, já falecido, e
de Jaime Cunha, hoje advogado, militante do PT.
Corria
o ano de 1969.
Em
poucos meses de trabalho, o movimento chegou a contar com 300 estudantes
organizados em dezenas de escolas da Região Metropolitana de Salvador.
Surgiram
vários jovens quadros políticos: Antônio Risério, Eduardo Paes Machado, José
Raimundo Fontes podem ser lembrados.
Risério,
escritor renomado.
Eduardo
Paes Machado, sociólogo, professor da UFBA.
José
Raimundo, deputado estadual atualmente, prefeito de Vitória da Conquista duas
vezes.
Repressão
percebeu a movimentação e em abril de 1970 desencadeou uma operação imensa
destinada a desbaratar o MOL.
O
comando sediava-se no famoso Quartel do Barbalho, base de apoio para as ações
de captura, detenção e tortura dos jovens militantes secundaristas.
A
repressão estava em plena ofensiva em todo o País.
Matara
Carlos Marighella em novembro de 1969.
Mário
Alves, no início de 1970.
Marighella,
da Ação Libertadora Nacional (ALN).
Mário
Alves, do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR).
Dois
grandes dirigentes comunistas.
Como
iriam deixar o MOL seguir adiante?
Mas,
os secundaristas da Polop não se deram conta dessa conjuntura.
Nem
a direção estadual.
Em
poucos dias, o MOL foi completamente destruído.
Montou-se
um aparato de guerra.
Comandado
diretamente pelo coronel Luiz Arthur de Carvalho, superintendente da Polícia
Federal e durante muito anos o principal dirigente da repressão da ditadura no
Estado.
A
repressão imaginava estar defronte de uma poderosa organização armada.
Havia
recolhido impressos com obras de Guevara, Marighella e tantos outros
revolucionários considerados dignos de estudo pela Polop, cuja tradição era de
uma organização voltada ao aprofundamento teórico.
Mas,
a repressão se preparara para o pior.
Gustavo
cai...
#MemóriasJornalismoEmiliano
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Emiliano
José
16
de janeiro 2020
Tocando terror
Noite.
Boca
da noite.
Gustavo
Falcón, Antônio Risério e Eduardo Paz Machado reunidos.
Jaime
Cunha não pôde estar presente.
A
coordenação do Movimento de Organização e Luta (MOL) discutia a ação de
agitação e propaganda do dia seguinte, Primeiro de Maio.
Era
o Brasil de Médici.
Do
terror.
Repressão
com dentes afiados.
Em
todo o País.
Terminada
a reunião, Gustavo e Eduardo caminham, saindo de Nazaré onde ocorreu o
encontro, em direção à Barroquinha, local do maior terminal de ônibus de
Salvador.
Seria
ali a ação do dia seguinte - das cinco da manhã em diante.
Panfletos
prontos lembrando o Primeiro de Maio como dia de luta dos trabalhadores, a
exploração, as violências da ditadura.
Não
iriam deixar passar a data em branco.
No
trajeto, conversavam animadamente.
Gustavo,
já militante e dirigente estudantil da Polop, gostava muito de Eduardo.
Ainda
simpatizante, prometia muito na visão dele.
Distraidamente,
ali pelas 9,30 da noite, desciam escadas cujo final era o Terminal da
Barroquinha.
Iam
passar os olhos no teatro de operações do dia seguinte, fazer um aligeirado
levantamento topográfico.
No
meio da escadaria, o pau cantou.
Um
bocado de brutamontes surgiu não se sabe de onde gritando e batendo murros e
pontapés armas nas mãos ditadura de dentes arreganhados algemas apertadas.
O
bote estava armado.
A
operação destinada a desmantelar o movimento estudantil secundarista dirigido
pela Polop estava marcada para aquela noite.
A
direção do MOL não se dera conta.
Tocava
a vida.
A
noite foi de terror.
Interrogatórios.
Torturas
físicas e psicológicas.
Gustavo
não dizia uma palavra.
E
ficou impressionado com o comportamento de Eduardo.
O
simpatizante não admitia sequer conhecer Gustavo.
Admirável.
De
repente, aos borbotões, empurrados, tiras gritando tocando terror, Gustavo
observa amigos entrando assim amedrontados olhos esbugalhados.
Todos
jovens, como ele e Eduardo
Juventude
despedaçada.
Destroçada.
A
felicidade, se é possível usar a palavra numa situação dessas, foi constatar a
inexistência, em meio a tanta gente presa, de qualquer companheiro da
Organização, como ele chamava a Polop.
Ao
menos, de qualquer quadro fora do movimento secundarista.
Em
menos de uma semana, Gustavo viu desfilar à sua frente quase todos os
participantes do MOL, inteiramente desbaratado.
Aberto
o inquérito, Gustavo se viu...
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Carmela Talento: Muito importante
relembrar esses fatos nesse momento de ameaça à democracia
Mônica Bichara: Verdade,
Carmelinha. Esse resgate da história do jornalismo baiano na ditadura é uma
aula para as novas gerações entenderem que é preciso lutar contra esse retrocesso
que estamos vivendo
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Emiliano
José
17
de janeiro 2020
Dois inquéritos
Gustavo
Falcón, passada a fase do terror absoluto, porrada e pergunta, vieram os
inquéritos.
Sim,
inquéritos.
Dois.
Um,
sabatinado pela Polícia Federal.
Outro,
pelo Juizado de Menores.
O
primeiro, por óbvio.
Pela
pura e simples existência da ditadura.
A
PF não deixaria barato.
Pouco
lhe importava não tivesse ainda completado 18 anos.
Mandava
às favas os escrúpulos legalistas, ainda mais sob Médici.
Era
um terrorista perigoso e ponto final.
De
qualquer forma, no entanto, era de menor, como se dizia à época.
Necessário
seguir formalidades da lei.
Além
de terrorista, era menor infringindo a lei.
A
rigor, devia ser ouvido apenas no âmbito do Juizado de Menores.
Mas,
nada.
Falava
a um e a outro.
Um
absurdo jurídico, absolutamente usual sob a ditadura.
Ninguém
passa pela experiência de prisão, tortura, cumprimento de pena, e sai ileso.
As
feridas ficam lá, na alma.
Para
sempre.
Há
quem queira ignorá-las, passar ao largo.
Mais
cedo, mais tarde, as feridas dão sinal.
Gustavo
diz: da tortura pode sair uma pessoa renovada.
Ou
um ser humano em frangalhos.
Renovada,
em termos.
Transformada,
melhor.
Ou
destruída, esfacelada, como ele disse.
Confessa:
fez bacharelado, mestrado e doutorado em ciências políticas aplicadas nos meses
passados preso.
A
prisão é uma escola política.
E
um termômetro para as convicções do ser humano.
Aquela
experiência, com toda sua brutalidade, quase pôs fim à sua vida de jovem
idealista.
Resistiu.
Onde
estivesse, manteve seus ideais, renovados.
Prisão
ensina profundamente o valor essencial da liberdade.
Foi
assim com Gustavo:
-
Fora da prisão, jamais havia tido a real dimensão do valor da liberdade.
Pensa:
a ditadura, sufocando as liberdades, o empurrara para a semi-clandestinidade.
Na
cadeia, dizia de si para si:
-
Para de agir. Pelo menos saímos livres da suspeita de integrarmos uma
organização terrorista.
Pensa
nele e nos outros:
-
Todos os que pagaram mais caro o preço da ousadia, como eu, Antônio Risério,
Eduardo Machado, Jaime Cunha, Antônio César Ramos Santos, entre muitos outros,
amargamos a dura experiência da derrota, da humilhação, do sofrimento que
passou a virar, para muitos de nós, perseguição, após sair da prisão.
Ao
sair da prisão, Gustavo...
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Rui Patterson: Continua? Ou só
no próximo livro?
Emiliano José: Rui Patterson
Amanhã, né Rui...
Lucia Correia Lima: Forte. Pena que
compadre em Facebook tem. Nem aí
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Emiliano
José
18
de janeiro 2020
Desafios
pós-prisão
Ser
preso, torturado enfrentar pena, são situações-limite na existência.
Houve
tentativas de suicídio de muitos na prisão.
Sei
de alguns.
Houve
suicídios pós-prisão.
Aqueles,
aquelas incapazes de suportar o peso deixado pelos monstros da ditadura em suas
almas.
Melhor
terminar o suplício com o fim da existência.
Ditadura
é isso e muito mais.
Insisto:
deixa marcas para sempre.
Muitos
sabem lidar com tais marcas.
Outros,
nem tanto.
Gustavo
Falcón sai da cadeia, olha o entorno, amigos sumidos assim, ditadura prendendo,
torturando, matando.
O
irmão, Pery Falcón, na clandestinidade.
Irmãs,
irmandade toda, de uma forma ou de outra, envolvida com a militância.
Família
comunista - esta.
Barra
tinha pesado, situação não era fácil.
Ainda
assim, decide seguir na luta.
A
frente de combate reclamava sua presença.
A
prudência recomendava recuo.
O
espírito comunista, ousadia.
Uma
coisa a cadeia fizera: formou seu caráter, deu-lhe uma rigorosa visão
humanista, a ser honrada até o final de seus dias.
Alea
jacta est: resolve mergulhar na clandestinidade, seguindo orientação da Polop.
Desembarca
em São Paulo, depois Rio de Janeiro.
Em
Niterói, torna-se assistente dos trabalhadores de base da Organização, fazendo
educação política.
Tentar,
tentou.
Mas,
tudo era pesado, duras as condições de clandestinidade, precária a vida, medo,
insegurança, um manto sombrio cobrindo a existência de um jovem recém-chegado à
maioridade.
Tão
jovem e tão velho, obrigado pelas condições políticas a amadurecer
precocemente.
Sente-se
cercado.
Dava
não.
Melhor
voltar à Bahia.
Vai
concluindo e era duro concluir: aquela estratégia era suicida.
Aquela
forma de luta não tinha futuro.
A
ditadura estava na ofensiva, e a esquerda tinha uma dificuldade enorme de
compreender isso.
Era
hora de recuo.
De
acumular forças.
Embarca
no Jornalismo e na Universidade.
A
democracia, sua baliza.
Seu
valor universal, à Carlos Nelson Coutinho, aqui sou eu me aventurando
teoricamente sem permissão.
Aproveitava
todas as brechas da censura na chamada grande imprensa, onde passou a
trabalhar, a partir da "Tribuna da Bahia", e disso já falei.
E
"Invasão", "Boca do Inferno", "Opinião",
"Ex", mergulho na imprensa alternativa, rico mergulho.
E
veio a Universidade...
#MemóriasJornalismoEmiliano
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Emiliano
José
19
de janeiro 2020
O nazi-fascismo
não dorme
Na
Universidade, estudante de Sociologia da UFBA, torna-se monitor da professora
Alda Mota, auxiliando-a nas tarefas das disciplinas introdutórias.
Ditadura
já vivia a disputa entre a linha dura dos porões e os defensores da distensão
lenta e gradual.
Recém-casado,
a remuneração da bolsa da monitoria o ajudava muito.
Complementava
a renda obtida como jornalista.
Ajudava
a garantir o sustento da casa.
A
disputa entre o porão e a distensão, que se iniciava, ia lhe render fruto
amargo.
A
ditadura exigiu a saída dele da função de monitor.
Comunista
não podia exercer tal tarefa.
Podia
fazer a cabeça da moçada.
Ordem
expressa da 6ª Região Militar.
Teve
uma alegria ao menos.
O
chefe do Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas da Universidade Federal da Bahia, professor Carlos Costa, entrega-lhe
carta de recomendação extremamente elogiosa.
Uma
palavra de conforto, revelando o espírito digno de um professor, com coragem
suficiente para evitar tornar-se vassalo dos militares.
Na
sua chegada ao jornalismo, me parece já ter dito isso, mas o que abunda não
vicia, agradece de modo especial a Hamilton Celestino e a Milton Caires de
Brito, esse ex-dirigente do PCB e Constituinte eleito em 1945.
A
"Tribuna da Bahia" garantiu a existência de Gustavo Falcón durante a
maior parte da década de 1970.
É,
mas o nazi-fascismo não dorme.
Os
dias atuais estão aí para reafirmar isso.
Numa
tarde monótona de Salvador, no segundo semestre de1973, é sequestrado à porta
da casa onde morava, no Engenho Velho de Brotas para pavor de sua jovem esposa,
grávida e desligada de qualquer tipo de atividade política.
Conduzido
à temível Polícia do Exército (PE), no Quartel do Barbalho.
Tinha
certeza: não estava envolvido mais com atividade clandestina.
Não
atinava com a razão.
E
ditadura precisa de razão?
Enquanto
seguia sequestrado, pensava no terror de passar por tudo de novo:
interrogatórios e torturas.
São
aqueles momentos eternos, onde tudo é dúvida, medo, insegurança.
Onde
tudo é incerto.
A
cabeça, em polvorosa
O
coração, acelerado...
#MemóriasJornalismoEmiliano
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Emiliano
José
20
de janeiro 2020
Pastor de abelhas
A
cabeça em polvorosa.
O
coração, acelerado.
O
que será que será?
Sequestrado.
Barbalho.
Gustavo
Falcón não sabia a razão daquele inesperado sequestro.
Daquele
mergulho no terror.
Novamente.
Pergunta
daqui, pergunta dali, e ele foi entendendo a razão do absurdo.
Havia
hospedado uma mineira, amiga de um colega de trabalho, Oldack Miranda, mulher
de José Carlos da Matta Machado, de Ação Popular, assassinado pela ditadura
junto com mais seis dirigentes da Organização, entre os quais Gildo Macedo
Lacerda, levado de Salvador para Recife, assassinado e desaparecido.
Essa
ofensiva sobre AP ocorreu entre outubro de 1973 e fevereiro de 1974, quando a
repressão mata os sete dirigentes.
A
ditadura achou pudesse Gustavo Falcón ter alguma ligação com AP.
Em
plena sala de tortura, um puxa-estica danado, Gustavo falando a verdade nesse
caso, não tinha nada a ver com AP, fizera um favor a um amigo ao hospedar a
moça, AP não era sua praia.
Liberado.
No
pedido de anistia, faz um balanço:
"Da
violência do Estado sobre a minha pessoa, resultou uma carga de prejuízos
morais, psicológicos e econômicos cujo cálculo extrapola a medição puramente
mercantil".
Juventude
quase despedaçada.
Liberdade
várias vezes cerceada e suprimida.
Obstáculos
à sua formação profissional e ao seu desempenho como estudante e trabalhador.
Viu,
ainda, sua família ser duramente perseguida.
Jacema
Elvira de Oliveira Falcón, detida no Congresso da UNE, Ibiúna, São Paulo, foi
obrigada a submeter-se a empregos precários por mais de uma década.
A
perseguição política impedia a irmã de ser médica com emprego regular.
Outra
irmã, Yara Cecy de Oliveira Falcón, presa em Recife, amargurou anos de prisão.
O
irmão, com quem compartilhei cadeia na Penitenciária Lemos Brito, Pery Tadeu de
Oliveira Falcón, preso duas vezes,. sempre torturado, foi amplamente
prejudicado em sua vida profissional por razões de ordem política.
Resolve
pedir reparação como uma exigência cidadã.
Para
nenhum governo mais ter a ousadia, sob nenhum pretexto ou argumento, de
prejudicar quem quer que seja por razões de ordem puramente ideológica ou
política.
"E
muito menos venha a sequestrar, torturar e ameaçar a integridade física, moral
e intelectual de qualquer ser humano. Nem comprometer o futuro, como foi o meu
caso particular, de nenhum jovem por ação repressiva, ilegal e extra-jurídica
do Estado".
Faz
tempo, Gustavo Aryocara de Oliveira Falcón recolheu-se à comovente atividade de
pastor.
Vive
em Cachoeira, onde, num pequeno sítio, pastoreia abelhas.
Muito
próprio nesse tempo de tentativa de
dizimação
da espécie pela proliferação desenfreada dos agrotóxicos.
Quer
ajudar a salvá-las.
#MemóriasJornalismoEmiliano
COMENTÁRIOS
Mônica Bichara: Bravo, Emiliano,
essas memórias tornaram-se leitura indispensável, verdadeira aula de história
Emiliano José: Mônica Bichara
Valeu, Mônica. Sempre honrado pela leitura.
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