Jaciara Santos: Entre rigor e delicadeza, filme revela trajetória das mulheres no jornalismo baiano

 

Por: Jaciara Santos 




Só agora a ficha começa a cair. Pelas lentes mágicas do cineasta Daniel Talento, não há dúvida: a geração da qual faço parte fez história no jornalismo baiano. O documentário “Entre a Caneta e o Poder – Mulheres no Jornalismo da Bahia” é um relato sensível (às vezes poético) da caminhada percorrida por mulheres que escolheram ser jornalistas, num período tão desafiador como os anos 1960-1980 do século passado.

Um período em que a jornalista não podia, por exemplo, usar uma prosaica calça comprida no dia a dia do trabalho. Sim, o dress code em vigor nas redações, predominantemente masculinas, vetava a indumentária às mulheres. Esse direito somente veio a ser conquistado com argumentos e persistência, marcas que caracterizam a força feminina.

Equilibrando rigor histórico e delicadeza, Entre a Caneta e o Poder revive os  tempos da ditadura militar na voz de Mariluce Moura, que sofreu literalmente – na pele e na alma – variados tipos de tortura. Dentro e fora das redações. Mas o filme também celebra o fim da escuridão, o retorno à democracia. E traz o relato de como a mulher jornalista viveu essa transição, o momento em que a luz apareceu no fim do túnel.

Retrato de uma época, o documentário expõe as lutas que nossa geração travou para impor respeito e mostrar que, como diz o lema feminista consagrado, “lugar de mulher é onde ela quer estar”. Saímos da retaguarda e assumimos a vanguarda das redações. Provamos que somos tão qualificadas quanto os colegas homens para ocupar cargos de chefia.

Mas tivemos que comprovar nossa capacidade. Às vezes, de forma dolorosa, como revelam os depoimentos: cumprindo tripla jornada (profissional-mãe-mulher), engolindo sapos, disfarçando desconfortos físicos, driblando todo e qualquer tipo de assédio.

O documentário idealizado e dirigido por Daniel Talento é um testemunho de quem nasceu e cresceu por entre laudas e máquinas de escrever, numa época em que nem sonhávamos com a escrita eletrônica. Sim, porque a inspiração maior para a obra é, indiscutivelmente, a mãe do cineasta, a jornalista Carmela Talento, referência para toda uma geração de jornalistas homens e mulheres.

Em 1h20, transborda da telona para a plateia a emoção das seis entrevistadas – cinco delas, as “comadres”, criação literária do mestre Emiliano José, ele também personagem do documentário. É vida, é história, é resgate. Vou parar por aqui. Não posso prosseguir sem o risco de dar spoiler. Como disse no início, somente agora a ficha caiu. Após quase uma hora e meia de exibição, a produção me convenceu:  nossa geração e (especialmente) a que veio antes pavimentaram os caminhos abertos, com determinação e luta, por heroicas pioneiras. A Daniel e equipe, nosso agradecimento.

Ficha Técnica

 

Direção: Daniel Talento

Produção: Roger Cunha

Direção de Fotografia: Ruan Souza e Daniel Talento

CG: Lucas Ferraz

Produção Executiva: Karen Zardi e Daniel Talento

Montagem: Evodio Jr.

Trilha Sonora: Bob Bastos

Participação Especial: Emiliano José

Produção Associada: Erica Iotty

Produzido por: Arpoador Audiovisual e Tia Maria Filmes

Apoio: Igluloc, Mantra, Pontomov, Planeta Filmes Sinopse

Jornalistas entrevistadas: Carmela Talento, Isabel Santos, Jaciara Santos, Joana Darck, Mariluce Moura e Mônica Bichara.







Comentários

  1. Como sempre, texto primoroso sobre o lindo documentário (a minha ficha ainda está caindo), minha comadre👏👏👏Simples, direto, bonito..., digno de uma excelente profissional, da qual me orgulho de ser contemporânea em duas redações, iniciando uma profunda Amizade no JBa. Que saudade daquele. Eu estou com uma imensa Gratidão a Daniel Talento por tanto talento ao realizar este projeto. O parabenizo, e a toda sua equipe, com muito carinho.

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