Você não sabia? ABL é lugar de machos



Com a eleição de Cacá Diegues para ocupar a vaga de imortal que foi de Nelson Pereira dos Santos, há quem proponha que a Academia Brasileira de Letras acrescente a letra "C" de Cinema, adotando a sigla ABLC. Calma, é só a ironia de alguns nas redes sociais.

Cacá é um cineasta reconhecido internacionalmente e um dos fundadores, junto com Glauber Rocha, do Cinema Novo, movimento que nasceu nos anos 60 com o objetivo de discutir as questões brasileiras consideradas urgentes, como a desigualdade social. Isso é notório e conhecido, mas é o suficiente para vencer outros 11 candidatos?  Os 22 dos 40 imortais da ABL decidiram que sim.   

Que ironia mais sem noção essa das redes sociais, que não considera o lado escritor do novo imortal, mais conhecido como cineasta. Para quem não sabia, eis os títulos dos livros: "Vida de Cinema", "O que é ser  diretor de Cinema", "O Diário de Deus é  Brasileiro", "Cacá Diegues, o cineasta do Brasil", "Vida de cinema: antes, durante e depois do Cinema Novo". 

Conceição Evaristo seria a primeira mulher negra a ocupar uma cadeira de imortal em 120 anos. Apesar da ampla campanha de leitores, literatos, escritores e instituições afins nas redes sociais, em reconhecimento à sua obra e à representação que faria  na  Academia Brasileira de Letras, a ABL, ela perdeu a eleição realizada no último dia 30 de agosto. Só teve um voto! Alguém aí surpreso? Frustados e indignados certamente muitos brasileiros, em especial negros e mulheres, como também os conhecedores dos seus livros de romances, contos e poesias, dentre os quais  “Olhos d’água”, que recebeu o Prêmio Jabuti, em 2014, e Ponciá Vicêncio.




Ah, mas que otimismo esse de achar que a arcaica e conservadora ABL daria ouvidos ao clamor popular, logo ela que não tem nada de popular, nem de justa. Logo essa instituição que foi idealizada por uma mulher, mas a excluiu quando foi criada. Sim, a escritora Júlia Lopes de Almeida, a brasileira mais publicada da Primeira República (1862-1934) foi  idealizadora e fundadora da Academia Brasileira de Letras – ABL, mas nunca se tornou imortal da instituição.

Júlia foi pioneira da literatura infantil no Brasil, escreveu para O país, Jornal do Comércio, Gazeta de Notícias e A Semana e, junto com outros escritores e intelectuais brasileiros, idealizou e fundou a ABL. No entanto, seu nome foi substituído pelo de seu marido Filinto de Almeida e excluído dos “40 imortais” fundadores, que optaram por manter a entidade exclusivamente masculina, aos moldes da “Académie Française”, a partir da qual inspiraram a do Brasil. 

O veto à participação de mulheres na ABL só terminou em 1977, com a eleição de Rachel de Queiroz para a cadeira número cinco. Foram oito décadas da ABL sem participação de nenhuma mulher na instituição. Durante toda a sua história, dos 288 intelectuais consagrados e eleitos, apenas oito foram mulheres.

 Agora, entrar mais uma mulher e negra! Ah, tá! Há que se fazer justiça nesta história: entre os seus imortais figura um negro, Machado de Assis. 
Como diria meu amigo Irecê: me batam um abacate! 


Comentários

  1. Crônica de um machismo anunciado. A ABL perdeu uma grande oportunidade de se aproximar dos mortais. Mas quem contava com isso?

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